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Tese resgata relevância de processos comunicacionais espontâneos da cultura quilombola

A Festa de Santo Antônio, em Cananéia, é um dos símbolos de resistência da comunidade

11/05/2017 11h20

Resistência é a palavra que define a vida dos quilombolas espalhados por todo o Brasil. A luta por terras e pelo reconhecimento de sua cultura e tradições é histórica e, ainda hoje, as comunidades quilombolas são marginalizadas. O quilombo do Mandira, localizado em Cananéia, cidade do litoral paulista, é apenas uma das comunidades tradicionais que resiste na luta por reconhecimento.

Renata Castro Cardias Kawaguchi, doutoranda da Universidade Metodista de São Paulo, está realizando uma pesquisa multidisciplinar nos programas de pós-graduação em Comunicação Social e Ciências da Religião sobre a Festa de Santo Antônio, realizada pelos quilombolas em Cananéia e os processos comunicacionais de identidade e religiosidade popular. “A intenção é trazer para discussão o mosaico identitário brasileiro como acontece nessa comunidade quilombola com influências caiçaras”, diz.

Renata é bacharel em Turismo e teve seu primeiro contato com a comunidade de Cananéia em 2012, durante uma atividade que visava conhecer as iniciativas de Turismo de base comunitária. “Desde então tenho me interessado pelas suas manifestações culturais imateriais, principalmente festas e celebrações enquanto processos comunicacionais”.

Além da pesquisa bibliográfica fundamentada no viés de Comunicação e Cultura, baseada nos Estudos Culturais ingleses e latino-americanos, Renata realizou pesquisa documental e etnográfica, com observação participante na Festa de Santo Antônio e entrevistas com membros da comunidade. Em sua pesquisa, percebeu a complexidade das manifestações dessa comunidade que realiza festas católicas, com fortes influências afro e caiçaras e atividades não religiosas, como bingo, por exemplo.

Origens

A doutoranda chama a atenção para a origem de Santo Antônio como o santo protetor deste quilombo, pois na estruturação do Brasil como colônia, os senhores de escravo viam o padroeiro como o santo que trazia de volta os escravos que fugiam. Com a ressignificação de Santo Antônio, ele ganhou a imagem de protetor dos negros, o que era um símbolo de opressão se tornou um refúgio para essas pessoas. Hoje, as festas religiosas nos quilombos são elementos fortes de resistência e cada comunidade tem seu santo protetor. 

"O Brasil foi, ao mesmo tempo, o paraíso da terra e o inferno para os colonizadores, pois eles consideravam os índios e os negros como deformados e esse preconceito ficou enraizado em nossa cultura. Essa luta de resistência começa, então, pela religião, mas é também política, social e econômica", ressalta.

Valorização

Renata ressalta que negligenciamos a importância dessas comunidades na história do nosso País: “desconhecemos nossos povos e comunidades tradicionais que também contribuíram para a formação das diversas identidades culturais brasileiras. Acredito que a Comunicação é um direito, e esses povos também têm o direito de criar e produzir suas próprias narrativas. Os processos comunicacionais espontâneos, como suas festas religiosas, são expressões da cultura dessas comunidades e é através delas que os quilombolas da cidade que eu estudo se manifestam”.

As análises da pesquisa ainda estão sendo desenvolvidas, mas Renata percebe que a comunidade luta por seu direito à terra, assim como por seu direito de se comunicar e de ter seu patrimônio cultural reconhecido. “A valorização dos seus bens culturais imateriais como a Festa de Santo Antônio, reafirma a necessidade de ampliar o conhecimento sobre a cultura quilombola e valorizá-la no conjunto do repertório cultural brasileiro”, argumenta.

Para o desenvolvimento de produtos comunicacionais como publicações e vídeos, o quilombo depende do poder público e há um risco de desaparecimento dessas histórias e símbolos, já que a população mais velha é detentora dessas informações. “Se não valorizarmos e conhecermos a cultura de nossos povos e comunidades tradicionais, ela se perderá com a morte dos seus membros mais velhos. A valorização da cultura quilombola em Cananéia além de envolver a própria comunidade, precisa ser reconhecida pelo poder público para que sejam criadas políticas públicas para assegurar seus direitos de comunicar, expressar a sua cultura”, finaliza.

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