Israel - Meguido
Identificação
O local da antiga cidade de Megido tem sido identificado com o Tell el-Mutesellin. Ele está localizado no lado norte da serra do Carmelo e domina o desfiladeiro mais importante da planície costeira para o vale de Esdrelom. Possui um cômoro com 21 metros de altura e uma área de 10 acres no alto.
Megido na Bíblia
No cântico de Débora, Juízes 5.1-32, é feita uma referência a cidade de Megido (Juizes 5.19), mas não como cidade. Conforme esta passagem, os reis lutaram em Taanaque, perto do riacho de Megiddo. É significativo o fato de Megido não ser mencionada como cidade, mas como uma referência geográfica. Isto talvez revele a fraqueza da cidade naquele momento histórico. O texto bíblico de Juízes 5 é um dos mais antigos da bíblia. Provavelmente os seus relatos se referem ao período de 1150 a.C. O riacho de Megiddo traz a localização geográfica do conflito que ocorre entre as cidades estado cananéias e as tribos de Israel.
“Vieram reis e pelejaram; então, pelejaram os reis de Canaã em Taanaque, junto às águas de Megido; não tomaram ganho de prata. 20. Desde os céus pelejaram; até as estrelas desde os lugares dos seus cursos pelejaram contra Sísera. 21. O ribeiro de Quisom os arrastou, aquele antigo ribeiro, o ribeiro de Quisom. Pisaste, ó minha alma, a força.” (Juízes 5,19-21)
No livro de Josué temos duas referências a cidade de Megido. Ela é uma das cidades mencionadas na lista do livro de Josué 12.21.
Conforme o texto, a cidade foi conquistada por Josué e o povo de Israel. Megido fazia parte do território da tribo de Manassés. Mas a cidade permanece com certa independência em relação a tribo. Os cananeus continuam habitando nela, mas eram obrigados a pagar tributo aos israelitas (Josué 17.11 e Juizes 1. 27 ss).
Josué 17,11
- Porque em Issacar e em Aser tinha Manassés a Bete-Seã e os lugares da sua jurisdição, e Ibleão e os lugares da sua jurisdição, e os habitantes de Dor e os lugares da sua jurisdição, e os habitantes de En-Dor e os lugares da sua jurisdição, e os habitantes de Taanaque e os lugares da sua jurisdição, e os habitantes de Megido e os lugares da sua jurisdição: três comarcas. 12. E os filhos de Manassés não puderam expelir os habitantes daquelas cidades, porquanto os cananeus queriam habitar na mesma terra. 13. E sucedeu que, engrossando em forças os filhos de Israel, fizeram tributários aos cananeus, porém não os expeliram de todo.
Conforme Amihai Mazar, em diversos sítios, como Betsã, Meguido e Gazer, uma cultura Cananéia com elementos adicionais dos povos do mar existiu durante a idade do ferro I .A existência destes elementos apoia os relatos bíblicos de Juízes 1.27-35, bem como Josué 13.2-6, que listam estes territórios como não conquistados em Canaã.
Conforme o livro de 1 Reis, durante o reinado de Salomão a cidade de Megido é incorporada ao distrito administrado por Baaná, filho de Ailude. Deste distrito faziam parte as cidades de Taanaque e toda região que ficava perto de bete-Seã, perto da cidade de Sartã, ao sul da cidade de Jezreel, até as cidades de Abel-Meolá e Jocmeão. (1 Reis 4.29).
A cidade de Megido teria sido reconstruída por Salomão. O rei teria usado os trabalhadores que construíram o templo e o seu palácio para reconstruir as cidades de Megiddo, Hazor e Gezer. (1 Reis 9.15). Esta reconstrução indica que a cidade havia sido destruída. Este texto bíblico está no centro de uma grande polêmica levantada pelos arqueólogos. Ele foi usado como referência histórica para datar diversas construções da cidade de Megido, como sendo realizadas pelo rei Salomão. Esta cronologia está sendo questionada e consequentemente o valor do texto de 1 Reis 9.15 como referência histórica.
O rei de Judá Acazias morre na cidade de Megido, onde ele foi buscar refúgio após ser ferido na luta com Jeú. (2 Reis 9.27).
O rei Josias foi morto na batalha no vale em Megido contra o faraó Neco que veio em apoio ao rei da Assíria. (2 reis 23.29 e 2 Crônicas 35.22).
Estas cenas de batalha revelam que esta era uma região de conflitos e de muitas disputas. Isto se deve a localização geográfica. A cidade estava localizada num ponto estratégico para o controle da rota comercial.
Em Zacarias 12.11 é lembrada a planície de Megido como local de choro do Deus Hadade-Rimon. Este Deus esta relacionado a fertilidade. Os seus adoradores acreditavam que quando as plantas secavam o deus tinha morrido, por isso choravam a morte dele. Anualmente era celebrada uma cerimônia de luto a este deus da fecundidade: o deus da tempestade e da chuva (Adad) e do trovão (Remon). Este Deus morria no fim da colheita para reviver na estação das chuvas. Esta citação indica que na planície de Megido prevaleceu uma diversidade religiosa apesar da presença israelita.
Zacarias 12.8-14
8. Naquele dia, o SENHOR amparará os habitantes de Jerusalém; e o que dentre eles tropeçar, naquele dia, será como Davi, e a casa de Davi será como Deus, como o anjo do SENHOR diante deles. 9. E acontecerá, naquele dia, que procurarei destruir todas as nações que vierem contra Jerusalém. 10. E sobre a casa de Davi e sobre os habitantes de Jerusalém derramarei o Espírito de graça e de súplicas; e olharão para mim, a quem traspassaram; e o prantearão como quem pranteia por um unigênito; e chorarão amargamente por ele, como se chora amargamente pelo primogênito. 11. Naquele dia, será grande o pranto em Jerusalém, como o pranto de Hadade-Rimom no vale de Megido. 12. E a terra pranteará, cada linhagem à parte; a linhagem da casa de Davi, à parte, e suas mulheres, à parte, e a linhagem da casa de Natã, à parte, e suas mulheres, à parte; 13. a linhagem da casa de Levi, à parte, e suas mulheres, à parte; a linhagem de Simei, à parte, e suas mulheres, à parte. 14. Todas as mais linhagens, cada linhagem, à parte, e suas mulheres, à parte.
O texto de Zacarias faz uma comparação entre a lamentação à Adad-Ramon e a lamentação de Jerusalém. A lamentação no vale de Megido traz uma lembrança histórica, a morte do rei Josias na batalha no vale em Megiddo ( 2 Crônicas 35.22). A lamentação de Jerusalém recorda o luto nacional pela morte de Josias. O rei traspassado em Megido é a figura do povo que cai pela espada do exílio. A morte do povo no exílio estava prefigurada em Josias. Esta morte o povo deve lamentar[1].
O escrito de Zacarias remonta o período de 312 a.C , quando o rei Ptolomeu fez campanhas na Palestina entre a batalha de Palaegaza e sua volta para o Egito. Ele atacou Jerusalém, desmantelou fortalezas e recolheu um despojo considerável. Levou, ainda, um grupo considerável de prisioneiros para o Egito. É significativo que a cidade de Megido não existia mais neste período. Ela foi destruída pelos Assírios, e ao que tudo indica não foi reconstruída. Mas ela permanece como uma referência na memória do povo de Israel.
No novo testamento é feita uma referência a Megido no livro de Apocalipse 16.16: “E os congregaram no lugar que em hebreu se chama Armagedom.” Armagedom deriva de har-meghiddôn, que significa o monte de Megido. Neste local acontecerá a peleja do grande dia do Deus Todo-poderoso. Mais uma vez temos o vinculo desta região de Megido com confrontos e batalhas.
No início do século XX, este vinculo foi novamente retomado, quando Megido foi palco de novas batalhas. Em 1918 os inglenses derrotaram alí os turcos otomanos, e em 1948, durante a guerra da independência, os israelenses prevaleceram contra os árabes que invadiram bem próximo dali em Mishmar Haemek.
Significado do nome
A palavra mgdd “Megiddo” deriva do verbo gdd, cortar, penetrar, formar uma tropa (conforme o substantivo dwdG., ,“gedûd”, banda, tropa). O nome Meguido significaria o “lugar de reunião das tropas”[2].
Localização
A cidade de Megido estava localizada ao pé da serra do Carmelo, próxima a rota comercial e militar conhecida por Via Maris e do vale de Jesrael.
A Via Maris estendia-se pela planície costeira, passando ao largo do Rio Jarcon, e continuava ao longo dos limites orientais da Planície de Sarona até o Vale de Jesrael, perto de Meguido. Dela, uma ramificação prosseguia até o Vale de Betsã e a Transjordânia, outra continuava para o norte através de Hasor rumo à Síria, e uma terceira passava a partir de Meguido ou através do Carmelo até o Vale de Aco e a costa libanesa.
Os vales de Jezrael e Betsã são os maiores vales interiores do país. A rota internacional entre a Síria e o Egito passava através desses vales, e assim eles eram de uma importância estratégica especial.
A localização da cidade de Megido permitia o controle de uma das mais importantes rotas militares e comerciais da antigüidade. A cidade também comandava um maravilhoso panorama do vale de Jesrael. A base econômica da cidade era fornecida pelas vilas deste vale.
Breve histórico da pesquisa arqueológica
As escavações tem descoberto ruínas de cerca de 25 cidades, datando desde 4.000 a.C., até o ano 500 a.C. As ruínas agora estruturadas e visíveis mostram uma cidade de estábulos bem fortificada, marcada por grande conhecimento de engenharia.
As descobertas arqueológicas em Megido fazem deste local um dos sítios arqueológicos mais importantes de Israel. Atualmente, Megido também está no centro de uma grande polêmica. Pesquisas arqueológicas indicam diferentes datações para os estratos da idade do ferro. Enquanto alguns indicam que os estábulos foram construídos por ordem do rei Salomão, outros afirmam que as grandes construções da cidade são do período da dinastia dos amrides, e consequentemente a grandeza do reinado de Salomão seria uma criação literária. Procuraremos esclarecer pontos desta polêmica ao apresentarmos algumas descobertas arqueológicas do período do ferro.
Em Megido houveram quatro grandes pesquisas arqueológicas. A primeira escavação aconteceu entre os anos de 1903 a 1905 com o apoio da Sociedade Germânica para os Estudos da Palestina. Esta pesquisa foi conduzida pelos alemães G. Schumacher e C. Watzinger. Schumacher fez um corte vertical sobre o monte de norte para o sul com 65 de largura e profundidade, e um número de pequenos cortes em outras partes do sítio, identificando seis níveis de construção. O seu achado mais importante foi um sinete de jaspe representando um leão que ruge com a inscrição “pertence a Shema, servo de Jeroboão”.
Entre os anos de 1925 e 1939, no período entre as duas grandes guerras mundiais, houve uma grande escavação americana em Megido, organizada pelo Instituto Oriental da Universidade de Chicago e dirigida por C.S. Fischer, P.L. O Guy e G. Loud. Esta expedição contou com o apoio de John Rockefeller, o que possibilitou o uso de um balão aéreo para fotografias e a construção de um confortável centro de moradias para os pesquisadores.
O objetivo original do Instituto Oriental era remover o cômoro inteiro, camada por camada até à base. Esta metodologia, conforme Israel Finkelstein, produziu dois grandes defeitos. Primeiro, cada camada de habitação era uma gigantesca resposta impossível de ser completada. Segundo, a exposição de cada camada ao tempo produz a impossibilidade da escavação avaliar a relação vertical, que era essencial para compreender a estratigrafia do sitio. Esta série de erros metodológicos são um dos motivos da confusão que está caracterizando a interpretação deste sítio.
Apesar de tudo, a escavação do Instituto Oriental produziu um número extraordinário de descobertas e identificou 20 níveis maiores do período Neolítico ( seis mil antes de Cristo) até o período Persa (500 a .C.).
O clima político entre 1939 e 1949 quase parou o trabalho de campo. O trabalho de pesquisa arqueológica foi retomado após a guerra da formação do Estado de Israel em 1948, quando a Palestina foi dividida em dois estados, Jordânia e Israel.
Nos anos de 1960 a 1971 foi desenvolvida uma pesquisa tendo como principal patrocinador a Universidade Hebraica. O diretor desta pesquisa foi Yigael Yadin. Foram três curtas sessões. Seu objetivo foi esclarecer problemas relatados na complicada estratigrafia para o restante do período de Salomão, décimo século antes de Cristo, observando em particular as fortificações. Em diversos aspectos ele foi bem sucedido, em outros apenas somou mais confusão, conforme avaliação de Israel Finkelstein.
Desde de 1994, sob a coordenação de Israel Finkelstein, estão sendo realizadas escavações em Megido. Estas escavações fazem parte de um projeto da Universidade de Tell Aviv. O sítio foi dividido em seis áreas. A última escavação aconteceu em julho de 2004 durante sete semanas, com cerca de 75 colaboradores de diferentes povos. Quatro áreas puderam ser escavadas com resultados frutíferos e interessantes[3].
Alguns resultados da pesquisa arqueológica
Os marfins de Meguido
Uma coleção com mais de 300 peças de marfim entalhado foi descoberta em uma sala subterrânea do palácio de Megido, estrato VIIA. Esta sala estava anexa ao palácio do lado oeste e incluía três câmaras dispostas em fila, que podem ter servido como salas do tesouro ou oratório. Muitos desses objetos foram visivelmente manufaturados durante o Bronze Recente II e colecionados pelos reis de Megido por um período de várias gerações[4]. Os mais recentes entre os marfins foram confeccionados na primeira metade do século doze a.C., pois um deles ostenta o nome de Ramsés III.
Esta coleção de marfins demonstra uma viva arte local, bem como conexões e influências internacionais. Isto reflete a natureza cosmopolita deste período, fim da idade do bronze recente e na primeira metade do século doze a.C. Os marfins entalhados são talvez a melhor representação do mundo artístico da Idade do Bronze Recente. Do ponto de vista cultural este marfim representa a última fase na sucessão de cidades Cananéias em Megido.
A arte de entalhamento em marfim na Cananéia continuou durante toda a Idade do ferro I. Nos objetos desta época se encontra a mistura de tradições cananéias com motivos trazidos pelos povos do mar, como demonstram a variedade de artefatos culturais de Betsã, Megido, Asdod e Tell Qasile. Essa arte é uma conexão entre a idade do Bronze Recente e a desenvolvida na Palestina e na Fenícia durante a Idade do ferro II .
O período do Ferro
Em Megido os escavadores reconheceram remanescentes de quatro níveis da Idade do Ferro II, os estratos V- II. No mais antigo, estrato V, observou-se que havia subfases em certas áreas do sítio, denominadas “Estrato VA” e “Estratos VB”. W.F. Albright, seguido por G.E. Wright, sugeriu que os escavadores deixaram passar despercebido um nível de ocupação inteiro, ao qual diversos edifícios da Fase VA e alguns do estrato IV deveriam ser atribuídos. Ele chamou o novo nível de “Estratos IVB-VA”.
Violentas destruições pelo fogo atingiram Megido no estrato VIA. A cidade foi reconstruída como uma cidade não murada, com moradias acompanhando o perímetro do cômoro com paredes externas criando uma linha defensiva, estrato VB. Nenhuma habitação ou edificação pública deve ser atribuída a essa fase. O Estrato seguinte, IVB-VA, incluía dois palácios (6000 e 1723) e outros edifícios de natureza pública. Possivelmente a cidade era cercada por um muro de casamata. Esse muro de casamata era adjacente a um portão monumental de cantaria com seis câmaras, medindo 17,8m x 20m, o qual foi atribuído pelos escavadores originais ao estrato IV.
No Estrato IVA, uma sólida muralha com ressaltos e reentrâncias e um grande complexo de edifícios de estábulos foram construídos. O portão de seis câmaras foi mantido por algum tempo, mas finalmente foi substituído por um tipo de quatro câmaras. Essa nova cidade sobreviveu até a conquista de Meguido pelos assírios em 732 a.C.
As casas de quatro cômodos
Em Megiddo, as casas de quatro cômodos são encontradas em estratos da Idade do Ferro I. Estas construções estão presentes em diversas regiões do país e em diferente tipos de sítios, como os dos cananeu-fenícios e nas planíces setentrionais[5].
Durante a Idade do Ferro I os povos que habitavam a Palestina adotaram o modelo de casa com pilares. Possivelmente este tipo de casa está enraizada na arquitetura doméstica de Canaã meridional na Idade do Bronze Recente. Durante o período da monarquia este tipo de casa tornou-se a marca registrada da arquitetura doméstica israelita.
Estas casas eram usualmente de forma retangular ou quadrada e com um pátio retangular central cercado de salas ou pórticos com pilares nos três lados. Na maioria dos casos, a entrada leva diretamente ao pátio central, como demonstra a figura.
Metalurgia
Industrias metalúrgicas floresciam durante a Idade do Ferro I[6]. Uma estatueta de bronze do tipo cananeu mostrando uma divindade sentada, que foi encontrada no lugar alto do estrato XI em Hasor, deve ter sido confeccionada numa oficina Cananéia, em cidades como Betsã e Megido.
Na metalurgia, na Idade do ferro I, a matéria prima vinha provavelmente de Arabá (timna e Finon), de Chipre e da reciclagem de objetos mais velhos. Utensílios de bronze refletem a influência egéia e cipriota, aparentemente relacionada com imigração dos povos do mar. Esses utensílios incluem armas encontradas em Meguido, Tell Qasile, Aczib e Tell es-As’idiyeh. Entre essas armas estão machados duplos, machados-enxós, pontas de laça alongadas com hastes e uma espada brônzea de tipo europeu com um paralelo cipriota da época. A substituição do bronze pelo ferro foi gradual culminando somente no século dez a.C.
Instalações de culto
Um local de culto foi encontrado em um grande edifício residencial nos estratos IVB-VA perto do portão da cidade. Os achados incluem altares monolíticos com chifres, pedestais cilíndricos de cerâmica sustentando tigelas de oferendas, cálices usados para servir oferendas e vasos adicionais de cerâmica usados em cerimônias religiosas. Estas coleções são similares às encontradas em Laquis[7].
Altares monolíticos de pedra similares, a maioria com quatro chifres nos cantos, são comuns em toda a Idade do ferro II em habitações israelitas, bem como em santuários (Dã, Atrad, Megido, Laquis, Tel Cedes). Esses altares também predominavam na cidade-Estado de Ascaron.
O sistema de água
Para garantir o acesso a água foi escavado na rocha do lado de dentro da cidade um largo túnel vertical de 30 metros[8]. Quando foi atingido o leito da rocha, foi cortado um túnel horizontal com mais de 50 metros, que conduz até uma fonte fora da cidade. O túnel horizontal foi alongado e aprofundado para permitir que a água escoasse até a extremidade interna no fundo do poço. Este se transformou em uma espécie de cisterna, de onde a água era trazida para a cidade com a ajuda de polia, cordas e recipientes de couro. A fonte fora da cidade ficava escondida pela muralha e coberta por terra.
Projetos de suprimento de água foram encontrados por todo país: Hasor. Yoqneam, Jeblaam, Tell es-Saídiyeh, Gazer Gabaon, Jerusalém, Bersabéia, Arad e Cades Barne. Estes projetos são evidência do desenvolvimento de uma engenharia e hidrogeologia prática.
Em Megido, o suprimento de água aconteceu primeiro por meio de uma passagem construída em pedras de cantaria que permitiam o acesso à encosta do cômoro, onde o caminho descia para a fonte externa. Este acesso faz parte dos estratos IVB-VA. A passagem subterrânea sobre a rocha pertence ao estrato IVA.
Edifícios públicos – Estábulos ou armazéns reais?
Um edifício público israelita comum era uma estrutura retangular alongada. Internamente ela era dividida por duas fileiras de pilares de pedra com uma passagem central flanqueada por duas naves[9]. Conforme Mazar, estas unidades começaram a aparecer na planície costeira durante o século onze a.C. Elas se tornaram comuns em sítios israelitas do século nove a.C. em diante. Em Megido, havia dezessete exemplos agrupados em dois conjuntos.
“As dimensões das estruturas variavam de 16 a 18 metros no comprimento e 10 a 12,5 metros na largura. Em cada fileira havia de dez a catorze pilares, usualmente consistindo em monólitos sólidos com seção quadrada. Na maioria dos casos, as naves eram pavimentadas com pedras, e a passagem central, com terra batida. Imagina-se que os edifícios tinham um telhado mais alto na parte central, com janelas de clerestório provendo luz e ar para o interior.”[10]
O maior grupo desses edifícios públicos foi descoberto em Megido no estrato IVA. Doze desses edifícios estão na parte norte do cômoro, distribuídos em três grupos em volta de um pátio retangular. Outros cinco estão localizados no lado sul do cômoro, atrás de um grande pátio quadrado cercado por um muro.
A datação destes edifícios públicos e a sua utilidade não encontram consenso entre os pesquisadores. Os escavadores Y. Aharoni e Z. Herzog indicam a época de Salomão, e sugerem que as edificações seriam armazéns reais. J. W. Crowfoot, Y. Yadin e Amihai Mazar identificaram os edifícios como estábulos e que seriam da época de Acab.
A utilidade dos edifícios
Em 1468 a.C., Meguido foi conquistada por Tutmósis III. As inscrições gravadas nas paredes do templo de Karnak pelos escribas do Faraó enumeram os despojos encontrados: “Lista dos despojos que o exército de sua Majestade levou da cidade de Meguido: 340 prisioneiros vivos e 83 escravos; 2041 cavalos, 191 jumentos, 6 garanhões ... potros; 1 carro dos inimigo, trabalhado em ouro, com uma arca em ouro; 1 belo carro do príncipe de Megido, trabalhado em ouro ... 892 carros do seu miserável exército; ao todo, 924; 1 bela cota de malhas de bronze deste inimigo; 1 bela cotas de malhas de bronze do príncipe de Meguido; 200 cotas de couro (?) de seu miserável exército; 502 arcos e 7 dardos deste inimigo, trabalhados em prata e madeira de meru”[11].
A presença nos despojos de 2041 cavalos revela que em Megido havia uma tradição de cuidar de cavalos. Esta tradição , pelo histórico militar da cidade deve ter continuado, o que indica que os prédios públicos encontrados no período do ferro eram usados como estábulos. A planta desses edifícios e os detalhes também apontam nesta direção. Entre os pilares são encontradas valas de pedra e buracos nos pilares para amarração.
Em frente ao complexo sul havia um grande pátio cercado, o qual deve ter servido como uma área de treinamento, e grandes manjedouras ao lado do pátio podem ter sido o local de estacionamento de carros de guerra. Os estábulos de Megido podiam acomodar cerca de 450 cavalos, se essa interpretação estiver correta.
Conforme a Inscrição Monolítica, encontrada no antigo sitio assírio de Nimrud, o rei Acab fez parte de uma coalizão antiassíria contra o avanço de Salmanasar em 853 a.C. Esta inscrição registrou as forças organizadas contra Salmanasar.
“1.200 bigas, 1.200 cavaleiros, 20.000 soldados de Hadadezer, de Damasco, a pé, 700 bigas, 700 cavaleiros, 10.000 soldados de Irhuleni, de Hamath, a pé, 2.000 bigas, 10.000 soldados a pé, de Acab, o israelita, 500 soldados de Que, 1.000 soldados de Musri, 10 bigas, 10.000 soldados de Irqanata...”
Esta referência indica a força militar e econômica de Acab. A cidade de Megido com os seus estábulos deve ter sido usada como uma das guarnições do seu exercito.
A datação
A datação destes edifícios públicos não se define de forma isolada. Ela depende do conjunto dos achados arqueológicos do período do ferro, não só em Megiddo, mas também em outros sítios, em especial Hazor e Gezer. Os portões destas cidades, e os palácios de Megido são referencias fundamentais para estabelecer uma data.
Em Megido, os dois grandes conjuntos de prédios públicos foram localizados no estrato IV pela expedição do Instituto Oriental da Universidade de Chicago, nas décadas de 1920 e 1930. Um dos diretores da expedição, P.L.O. Guy, identificou esses edifícios como estábulos, datados do tempo de Salomão. A sua interpretação baseou-se na descrição bíblica das técnicas de construção salomônicas em Jerusalém (1 Reis 7.12), na referência específica às atividades de construção de Salomão em Megido, em 1 Reis 9.15, e na menção das cidades salomônicas para bigas e cavaleiros em 1 Reis 9.19[12].
1Reis 9,15
“O rei Salomão usou trabalhadores forçados para construir o Templo e o seu próprio palácio, para aterrar o lado leste da cidade e para construir as muralhas de Jerusalém. Também usou esses trabalhadores para reconstruir as cidades de Hazor, Megido e Gezer.”
Na década de 1950, Yigael Yadin escavou a cidade de Hazor e identificou uma torre e três câmaras de cada lado do portão. Esta construção pertenceria à Idade do Ferro. Este portão era semelhante ao descoberto em Megido pela equipe do Instituto Oriental.
Pesquisando as anotações das escavações de Gezer, Yadin reconheceu que a construção identificada como um “castelo macabeu” pelo arqueólogo britânico R.A.S. Macalister tinha o mesmo tipo de estrutura de portão encontrado em Megido e Hazor. As descobertas dos portões das cidades de Hazor, Megido e Gezer foram reconhecidas como obra do império salomônico.
Em 1960, Yadin foi a Megido para esclarecer a uniformidade dos portões salomônicos. Ele escolheu escavar o lado leste desse portão. Ele descobriu remanescentes de um belo palácio, medindo 558 metros quadrados, construído com grandes blocos de cantaria. Um palácio mais ou menos semelhante já havia sido encontrado no lado sul do cômoro. O estilo destes palácios teria sido apropriado para a residência de um funcionário local, que foi identificado como sendo o governador regional, Baana, filho de Ailud (1 Reis 4.12). Resultou daí a conclusão de que os dois palácios e o portão representavam a presença de Salomão em Megido. Os estábulos acabaram sendo identificados com uma cidade posterior, construída pelo rei Acab no começo do século IX a.C.
Em Megido, o portão interno de seis câmaras era construído em alvenaria de cantaria de alta qualidade. A passagem central tinha 4,20 metros de largura. É o único desses portões que foi inteiramente construído de pedras de cantaria. O portão externo, construído sobre a encosta do cômoro, pode muito bem ser atribuído a uma segunda fase na história desse portão, provavelmente no século nove a.C. Os portões das cidades de Megido, Hasor e Gazer foram registrados por Y. Yadin como ilustração evidente de uma operação de construção régia centralizada, atribuível a Salomão com bases arqueológicas, bem como com base na referência bíblica de 1 Reis 9.15-17.
Os palácios de Megido também foram construídos com pedra de cantaria. Eles possuem uma grande semelhança com o palácio na Samaria. O palácio mais ao sul em Megido e o palácio na Samaria são os únicos edifícios na Idade do Ferro que possuem blocos de cantaria com tipos específicos de marcas de pedreiros. A semelhança arquitetônica entre as cidades revela que foram construídas numa mesma época, provavelmente sob a dinastia dos amrides.
Conforme Israel Finkelstein e Neil Asher Silberman, a arqueologia datou de forma equivocada vários períodos de Davi e de Salomão com margem de erro de um século inteiro. Três argumentos são apresentados por eles para indicar uma nova cronologia . Primeiro, a característica cerâmica filisteia não indica um datação segura. Ela deve ter continuado durante o século X, muito tempo depois da morte de Davi. Segundo, os estilos arquitetônicos e as formas de cerâmica em Megido, Hazor e Gezer foram novamente analisados indicando que pertencem ao começo do século IX a.C., décadas depois da morte de Salomão. Terceiro, testes com o carbono 14 realizadas com amostras de localidades incluídas no debate foram atribuídas ao século X, muito tempo depois da época de Davi. Esta nova datação ajuda a compreender porque os achados do século X em Jerusalém e em Judá são tão escassos. Eles revelam que Judá naquele tempo ainda era uma região remota e subdesenvolvida.
Proposta de quadro da estratigrafia do sítio
Período/ Cronologia | Estrato | Baixa Cronologia |
Ferro I A - 1150 | VII A | |
Ferro I B - 1000 | VI B / VI A | 900 |
Ferro II A – 925/900 | VA- IVB | 850 |
Ferro IIB – 850 | IV A | 750 |
Ferro IIC - 732 | III B | |
Ferro II C – 721 | III A | |
Ferro II C – 701/ 587 | II | |
Período Persa | I |
Bibliografia
BEAN, M., “Meguido”, em Dicionário Enciclopédico de la Bíblia,. Barcelona, Editorial Herder, 1993. p.988-990
FINKELSTEIN, Israel, “Back to Megiddo”, em Biblical Arqchaeology Review, vol 20, n.1, janeiro/fevereiro, 1994, p.26- 49
FINKELSTEIN, Israel e SILBERMAN, Neil Asher, A Bíblia não tinha razão, Editora Girafa, 2002.
GORGULHO, Gilberto. Zacarias - A vinda do Messias Pobre, Editora Vozes, 1985 Israel e Judá. Textos do Antigo Oriente Médio. Paulus. São Paulo. 2a edição.1995, 103 p.
MAZAR, Amihai. Arqueologia na terra da Bíblia. Paulinas. São Paulo. 2003, 554p.
MITCHELL, T.C., Megido, in. O novo dicionário da Bíblia, volume II, p. 1021-1023, edições Vida Nova, São Paulo, 1981.
WEIPPERT, Helga. Palästina in Worhellenistischer Zeit, Handbuch der Archäologie, 1988, phttp://www.tau.ac.il/humanities/archaeology/megiddo, pesquisado em 01de maio de 2005.
Eduardo Paulo Stauder avenida Francisco Glicério 626 Santos/SP 11065-400 (13) 3237.2616eduardostauder@luteranos.com.br
Notas
[1] GORGULHO, Gilberto. Zacarias - A vinda do Messias Pobre, Editora Vozes, 1985, página 119.
[2] M.Bean. Meguido. In Dicionário Enciclopédico de la Biblia,. Barcelona, Editorial Herder, 1993. p.988-990
[3] As atuais pesquisas arqueológicas em Megido podem ser acompanhadas pelo sitehttp://www.tau.ac.il/humanities/archaeology/megiddo/index.html
[4] MAZAR, Amihai. p. 294.
[5] MAZAR,Amihai. Arqueologia na terra da Bíblia, página 333.
[6] MAZAR,Amihai . página 344.
[7] Mazar, página 474.
[8] Na s dimensões do poço exitem informações divergentes. Conforme Mazar a profundidade do poço era de 16m. Filkestein indica a profundidade de quase 30 m, no seu livro a Biblia tinha razão, página 255.
[9] Mazar, página 450.
[10] Amihai Mazar, página 450.
[11] Israel e Judá. Textos do Antigo Oriente Médio, página 23.
[12] Israel Finkelstein e Neil Asher Silberman, A Biblia não tinha razão, página 192-3.
[13] Israel Finkelstein, A Biblia não tinha razão, página 199.