A presença da universidade em processos de fortalecimento de empreendimentos solidários
Nos segmentos da população de baixo poder aquisitivo, que possuem interesses e preocupações comuns, constata-se a cooperação comunitária que faz parte dos processos de produção, das condições materiais e da existência humana e social. O sentido de cooperação requer a compreensão de que as práticas de participação não são consideradas subversivas e nem propõem a composição de processos de contra participação. Estas novas práticas comunitárias de enfrentamento resultam numa realidade para seus integrantes, na qual é possível a satisfação mínima das necessidades de consumo e usufruto de bens e visam, principalmente, a reprodução da existência humana, (BERNARDES, 2010).
Dentro do conceito de economia solidária, o senso de igualdade, inter-relacionamento, mutualização, é percebido como uma postura, de apoio ao grupo e seus objetivo. Observa-se que existem comportamentos das pessoas, que propiciam a prática destes conceitos. Dentro das comunidades, a figura do líder comunitário traz à luz ações que propiciam a expansão e a prática da solidariedade, o que resulta em bem comum.
Os sistemas autogeridos que configuram os processos de econômica solidária voltam-se para os movimentos emancipatórios, com o foco na sociedade civil, ampliando as organizações não governamentais (ONG´s), e o resgate da dignidade humana de grupos oprimidos e discriminados, e a promoção de comunidades que por sua própria iniciativa e empenho melhoram suas condições de vida, renovam suas tradições culturais, (BERNARDES, 2007).
A prática da solidariedade contrapõe-se a competição entre os cooperados. A autogestão, no sentido solidário, acaba favorecendo a cooperação e estimulando em cada participante a disponibilidade para resolução de problemas gerais do negócio que criaram. Exige também de cada um a visão de longo prazo para a consecução de resultados (MARQUEZ, REFICCO E BERGER, 2009) e essa característica do processo leva, muitas vezes, as pessoas a desistirem do movimento.
A constatação de que os laços de cooperação e participação estão mais comumente ligados a comunidade, é evidenciada nos próprios relatos, onde se observa que as famílias podem se organizar de forma humana, e comunitária, dentro dos seus “espaços locais”. A postura que facilita a vivência de atividades de forma cooperativa e solidária, nas comunidades estudadas, ainda se encontra em processo construção, exigindo uma nova subjetividade. (BERNARDES, 2007)
Para Singer (2002) há um caráter histórico que não pode ser desconsiderado ao definir-se a economia solidária, que é entendida por ele como “criação em processo contínuo de trabalhadores em luta contra o capitalismo”. Segundo essa autor, assim como houve uma revolução social capitalista que durou séculos, até que relações econômicas e ideologia capitalistas se tornassem hegemônicas, há uma potencial revolução social socialista em andamento – de acordo sua ênfase na concepção de revolução social enquanto processo lento de mudanças sociais profundas, que ele distingue da concepção de revolução política, ou seja, a tomada, quase sempre violenta, do poder político.
Estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE – 2005), indicam que a maior mortalidade entre as empresas de micro e pequeno portes decorre especialmente de problemas de gestão e falta de planejamento, entre outros. Aqui, vale apontar a distinção entre empreendimentos por necessidade e por oportunidade.
Empreendimentos por oportunidade são aqueles que ocorrem mediante um planejamento prévio e visam ao aumento de renda ou independência financeira. Os empreendimentos por necessidade são aqueles cuja maior motivação para a ação é a carência financeira. Segundo a Global Entrepreneurship Monitor (GEM), “quanto maior a desigualdade social na localidade, maior a proporção de pessoas que empreendem por necessidade” (GEM, 2008, p. 34). Atividades artesanais, pequenos comércios, trabalho autônomo e de pequena produção, nestas condições, tendem a demandar a força de trabalho familiar. (BERNARDES, 2007)
As atividades inseridas na pequena produção urbana ou rural demandam, muitas vezes, força de trabalho familiar, não apenas como estratégia de sobrevivência na pobreza, na medida em que reduz custos, mas também como um elemento de confiança e de garantia para operar e manter os pequenos negócios em funcionamento (CACCIAMALI; TATEI, 2008).
O negócio inclusivo é um modelo de negócio que possibilita a conexão entre o setor de baixa renda com mercados centrais e possui potencial e aspiração para melhorar as condições de vida daqueles envolvidos com ele. Ele deve criar um valor econômico, ou seja, sustentabilidade financeira, capacidade de organização para operar indefinidamente, com custos oportunos e gerando lucratividade. Por outro lado, deve gerar também um valor social, ou seja, busca de melhoria social por meio de remoção de barreiras que dificultam a inclusão social, a assistência para aqueles temporariamente enfraquecidos e a eliminação dos efeitos indesejáveis da atividade econômica. Ele propicia uma mudança no statu quo, isto é, melhora as condições de vida das pessoas e grupos com ele envolvidos. Possibilita que grupos pobres possam participar da cadeia de valor de um determinado negócio, seja como produtor, fornecedor, comercializador ou consumidor, sempre agregando valor econômico e social. Os resultados não ocorrem rapidamente, é fundamental um visão de longo prazo, a agregação de valor econômico não é rápida e necessita de revisões e ajustes. (MARQUEZ, REFICCO E BERGER, 2009).
Os negócios inclusivos são atividades econômicas que abrem oportunidades à participação dos mais pobres em cadeias de geração de valor, de forma que possam agregar valor econômico a si mesmos e melhorar sua qualidade de vida. (MARQUEZ, REFICCO e BERGER, 2009). Segundo esses autores, há alguns atributos que identificam o negócio inclusivo e são eles: Transformação do status quo, ou seja, o potencial desses negócios de transformar positivamente as condições de vida das pessoas e grupos neles envolvidos. Outra característica é que o negócio inclusivo tem uma motivação comercial e que busca a rentabilidade, buscando a integração entre o êxito comercial e o benefício social, de forma direta e imediata. Em terceiro lugar, é possível caracterizar o negócio inclusivo como aquele que possibilita uma conexão entre o local e o global, isto é, ele possibilita romper o isolamento da informalidade. A “inovação paciente” é a quarta característica do negócio inclusivo, ou seja, o negócio inclusivo, deve ter uma expectativa de retorno a médio prazo, num processo que necessita de ações de experimentação e ajustes. Nesse sentido, necessita de análise e decisão sobre reestruturações internas e ter expectativas racionais quanto ao retorno financeiro de curto prazo. Ele deve também, basear-se em recursos locais, tanto no que se relaciona às práticas culturais, as redes sociais, as lideranças locais. Finalmente, o negócio inclusivo deve ser conduzido por novos e diferenciados protagonistas. (MARQUEZ, REFICCO e BERGER, 2009).
Atuando junto a esses grupos excluídos, a universidade pode ressignificar o uso de novas tecnologias, a partir de ações fundamentadas na formação humana e de economia solidária.
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https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/REGS/article/view/2312
GATTAI, S. e BERNARDES, M.A. Reflexões sobre o projeto de extensão universiatária: redes de gestão e serviços para uma economia solidária. In Revista Eletrônica de Gestão e Serviços, v.2, n1, jan/jul 2011.