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Francisco Caballero e Jorge González discutem ativismo social e pesquisa interdisciplinar

O IX Colóquio Internacional de Comunicação foi promovido pela Pós-Graduação em Comunicação e pelo grupo Comuni

06/09/2016 12h15 - última modificação 06/09/2016 16h31

Francisco Caballero e Jorge González discutem ativismo social e pesquisa interdisciplinar

Na última segunda-feira (05) foi realizado o IX Colóquio Internacional de Comunicação: ação social e pesquisa interdisciplinar. Promovido pelo Comuni, Núcleo de Estudos em Comunicação Comunitária, e o Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo, o evento contou com a presença de duas autoridades da comunicação: Dr. Francisco Sierra Caballero e Dr. Jorge A. González, a discussão foi mediada pela professora Cicília Peruzzo, docente da Pós-Graduação em Comunicação e líder do grupo de pesquisa Comuni.

Videoativismo

Docente da Universidad de Sevilla e diretor do Ciespal (Centro Internacional de Estudios Superiores de Comunicación para América Latina) do Equador, Caballero discutiu o videoativismo e novas práticas. “Esse é um tema muito atual e ontem pude ver isso de perto durante os protestos e os grupos como Mídia Ninja”, conta o professor.

Ele fala das coberturas realizadas na internet, por grupos individuais, como uma forma de interação da sociedade com as novas tecnologias, que “abre universos de possibilidades, de inovação social e mudanças sem comparação na história”. Nessa mudança, explica que existe também uma alteração dos autores, que “se manifesta como outra forma de contar e outras estéticas de manifestação social”.

Apesar disso, Caballero ressalta que o videoativismo não surgiu agora. Nos anos 60, 70 já existiam manifestações em que artistas utilizavam o visual como maneira de mobilização, em movimentos como direitos da mulher e das pessoas negras. O próprio cinema latino-americano é usado como exemplo, Glauber Rocha fez parte de uma proposta coletiva e libertadora. Também foram citados como exemplos, ações de educomunicação e movimento de trabalhadores organizados.

Nesse processo, no entanto, acontecem também problemas como a tensão entre individualização e socialização, espetacularização e consciência, produção cooperativa e divisão social do trabalho criativo.

Metodologia Interdisciplinar

O professor Dr. Jorge A. González, docente da Universidad Nacional Autónoma de México, conversou com o público a respeito de pesquisa interdisciplinar. Ele ressaltou em sua palestra que, muitas vezes, as pesquisas dentro da Universidade ficam focadas em suas áreas de conhecimento e não realizam um intercâmbio entre si. “As formas em que organizamos esse conhecimento ficam inseridas no texto”, diz.

González explica que a interdisciplinaridade se explica para estudar um sistema complexo que contenha: muitas escalas, muitos componentes, interações complexas e comportamento comum. Para estudar, por exemplo, o aumento de peso dentro de uma comunidade, é preciso formar uma equipe multidisciplinar com biotecnólogos, historiadores, educadores, médicos, economistas e comunicólogos. “O conhecimento existe quando há uma forma de construção integrada”, explica.

O processo de construção do conhecimento deve ser realizado com: questões para problemas de condições para custos, problemas para as perguntas, perguntas para atividades, atividades para o registro das propriedades, propriedades para a inferência das relações, relações do estabelecimento do estado, estados para a inferência das transformações, transformações para modelagem dos processos e processos para novas questões.

“O conhecimento não pode ficar apenas na área das ideias, conhecimento é ação e transformação”, argumenta o professor. Para ele, a resistência para interagir com outras áreas de conhecimento vem de muito antes da academia e esse preconceito atrapalha o pensar e o processo científico.

O Portal da Metodista entrevistou os dois professores, confira abaixo:

- Em um país grande como Brasil e em que alguns locais ainda não têm acesso a internet, o videoativismo pode ser excludente a essas pessoas?

Caballero: De certa forma, sim, pois são experiências muito localizadas e urbanas. Na maioria dos países em que se desenvolvem esses processos de ativismo social, eles têm a ver com grandes aglomerações, mas existem experiências muito interessantes com telecentros, infocentros, uma rede que tem importância no Brasil, que vincula os espaços locais a uma dimensão plural, com o trabalho de novas tecnologias. Evidentemente, não como movimentos sociais de ativismo, mas como inclusão digital, com processo de desenvolvimento rural, trabalhando com novas tecnologias.

Uma forma forte experiência do Brasil, além disso, temos que lembrar que MST e outros processos de ativismo social vem trabalhando com novas tecnologias, não só para denunciar as formas coloniais, mas também para a própria organização da movimentação social. A priori, evidentemente, o videoativismo é um processo basicamente urbano, mas eu assinalo casos de outros países como Colômbia, Chile, onde esses processos são basicamente rurais de ativismo, de forma menor, mas que existem também porque os jovens têm essa cultura tecnológica que antigamente não era possível.

É um processo urbano, em um sentido de que cada vez mais esses processos são mais fluídos, então permitem integrar setores que são tradicionalmente excluídos.

- Você citou que às vezes as faculdades têm dificuldade de discutir esse videoativismo dentro do espaço acadêmico, por que isso acontece?

Caballero: Acho que têm um conceito conservador da ciência e do ensino superior, e esse é um conceito moderno, que traz um caso concreto da linha crítica de ativismo social. Se separa pesquisa da ação, e nessa separação da pesquisa e da ação, que não corresponderia com o pensamento complexo contemporâneo, em que a pesquisa que tem que cada vez mais responder a problemas concretos, tratando em isolar como não-científicas certas perguntas vinculadas a questões sociais.

Por outro lado, especificamente a tecnologia, ou a revolução digital, acredito que de maneira geral, não posso falar em detalhes do Brasil, mas em geral, as faculdades de comunicação, não estão assumindo a mudança revolucionária da dimensão digital. Isso implica em outro modelo de governança e de pensar os processos vinculados à comunicação com as novas tecnologias. Primeiramente, é preciso ver com uma visão, de que com a teoria moderna clássica, estamos distantes das transformações sociais.

- Você acredita que o videoativismo teve impacto na mídia tradicional, ou as duas coisas ficaram totalmente separadas?

Caballero: Está tendo, por exemplo, na nova narrativa de ficção. O roteiro se imagina numa estética cada vez mais de videoativismo, e um modo de contar e fazer que sai dos jornais tradicionais, do jornalismo televisivo, mas acontece na ficção. Você vê certos elementos, narrativas, mas a mudança é em processos de coprodução, que se supõe com a nova televisão terrestre, é possível um processo mais interativo do próprio público, mas ainda não está sendo suficiente.

Estou vendo na estética da ficção certo elemento de um certo hiperrealismo, e uma narrativa muito mais natural que corresponde com a vida, na ficção televisiva isso está mudando na estética do videoativismo, em parte.

- De que maneira podemos aumentar a interdisciplinaridade dentro das Universidades?

González: Estudando de maneira menos pré-científica os processos de conhecimento, essa é uma condição futura, não é imediata. Porque temos que romper um monte de preconceitos, um monte de pré-noções que temos sobre o ofício de ver como inteligíveis os objetos. Então, por isso, eu diria que uma condição para entender os sistemas complexos, a teoria que está de trás disso, é uma teoria de natureza genética que é uma ciência positiva dos processos de conhecimento que tem uma coerência lógica muito forte, que foi construída para ser invalidade, para ser falsificada.

Seria também, conversar, facilitar os momentos de escuta, quando você tem um grande pesquisador ou pesquisadora que fala muito bem e você pergunta “mas como você construiu seu objeto de estudo?”, você vai aprender muito. Depois converse com um médico, e vá anotando, pois no fundo a teoria dá os elementos para conversar. Não das palavras, “eu não conheço o conceito de buraco negro”, mas isso é questão de linguagem, os processos que esses conceitos representam podem ser perfeitamente entendidos se conversados.

Mas esses espaços de conversa e encontro honesto entre estudantes quase não acontecem, você está ocupadíssima fazendo exames e trabalhos. Isso passa por uma reforma forte da universidade, dos sistemas educativos, mas dá também para começar a fazer trabalho de formiguinha.

- Temos uma dificuldade grande em levar o conhecimento científico a todas as pessoas, você acha que essa falta de diálogo entre as áreas também prejudica essa divulgação científica?

González: Claramente. A falta de diálogo das áreas e a falta de conhecimento, porque as pessoas na rua também criam conhecimento, é outro tipo de conhecimento, mas os mecanismos são os mesmos do cientista. Sabendo isso, alguma coisa dentro tem que descer para a humildade. Claramente falta essa aproximação da universidade com a sociedade, porque às vezes a universidade dá a ideia de que a gente está aqui dentro como seres superiores.

No meu livro falo sobre quatro componentes que prejudicam o conhecimento, que são: considerar sua cultura e raça melhores, preconceito de classes, machismo e o preconceito contra as pessoas mais velhas, que é ainda pior contra as mulheres. Todas essas noções acontecem no mundo acadêmico, mas também lá fora.

Essa coisa de ver a universidade como algo especial, não só qualifica demais, mas também dá maior responsabilidade. Estamos na elite, da elite, mas o mundo precisa de conhecimento e precisa de ação, conhecimento é ação. Mas se é ação, tem que diferenciar, precisa de voz, integrações para a ação dar mais certo. Precisamos ser menos surdos, estarmos mais abertos para escutar.

Se você gosta de dançar, você nem sabe quantos elementos são usados para que um movimento seja feito. Neurônios, tendões, órgãos, que estão combinados para fazer uma ação, para falar. É a integração, ninguém sozinho produz isso. Então, quando você começa a entender isso e que tem muitas coisas na vida que valem a pena, talvez desçamos do nosso grande ego, talvez não seja fácil, mas precisamos colaborar, o conhecimento é coletivo e é comum.

IX Colóquio Internacional de Comunicação

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