Representatividade plural na comunicação mercadológica foi tema do eCom

09/11/2016 14h40 - última modificação 10/11/2016 09h27

Foto: Pedro Zuccolotto

Arthur Marchetto

As práticas do mercado e de comunicação mercadológica tem deslocado suas ações cada vez mais para um novo ator no sistema comunicacional, o indivíduo coletivizado, e tomado iniciativas como o “marketing do um-a-um” ou o “micro marketing”. Outras perguntas, como “como ouvir e responder à diversidade de públicos em sua dimensão pessoal e coletiva?”, ou “como conviver com a crescente postura do opinion-sharing dos atores conectados?”, passam a habitar o ambiente de comunicação de mercado e foi para refletir sobre como esses novos conceitos, como  interferem nas relações da comunicação com o mercado que a VI Conferência Brasileira de Estudos em Comunicação e Mercado (eCom) aconteceu nesta segunda-feira, 31 de outubro, na Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), Campus Rudge Ramos.

Gladys Barbosa, integrante da pastoral universitária da UMESP, fez a introdução da IV eCom. Barbosa comentou sobre o aniversário de 499 anos da reforma protestante e reforçou a importância da leitura e da comunicação, usando o caso de Martinho Lutero como exemplo. Lutero, que percebeu um descompasso entre a leitura dos textos sagrados da Bíblia e as ações realizadas pelo clericato, como a venda de indulgências, passou a utilizar a tradução dos textos sagrados para impulsionar a reforma.

Depois da introdução, uma mesa de abertura foi composta pelo Diretor da Escola De Comunicação, Educação e Humanidades da Universidade, Nicanor Lopes, pela Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UMESP, Marli dos Santos, e pelo Coordenador do eCom, Daniel Galindo.

Nicanor Lopes, comentando que os eventos servem para “tirar algumas teias de aranha do cérebro”, trouxe em debate a formação da opinião pública na sociedade brasileira.  Para ele, existe um modelo de formação de opinião pública suspeita que reverbera conjunturas e estruturas “que já reconhecemos como falidas”. Dessa forma, Nicanor encorajou os participantes a responder como a opinião pública pode ser estruturada respeitando a pluralidade. “Eu entendo que a sociedade plural tem uma premissa dialógica. Sou plural quando aceito o outro como ele é, quando aceito a ideia do outro como tão verdadeira quanto a minha, e quando participo de uma sociedade onde as minhas premissas e os meus princípios não são os únicos e os exclusivos verdadeiros”, concluiu.

Seguida de Nicanor, Marli dos Santos comentou sobre comunicação e mercado em uma sociedade plural. “Eu estou tentando entender essa sociedade plural. Em que momento a gente tem essa pluralidade? Esse plural ele se restringe ao consumo?” e continuou, comentando sobre o momento histórico. “Das coisas que temos assistido no Brasil e no mundo precisamos refletir que sociedade plural é essa, que às vezes é muito intolerante”, disse Marli. Por fim, citou Pierre Bourdieu e seu texto sobre a manipulação da opinião pública e refletiu sobre a construção da cidadania dentro desse contexto.

A mesa de abertura se encerrou com a fala de Daniel Galindo. Citando os questionamentos e os termos das outras falas, Galindo comentou sobre o desconforto.  “Desconforto é bom. Quanto maior o desconforto, maior a propensão a resolver o desconforto, à ação”. A palavra reformar foi destacada, como complementar da primeira. “Reformar implica em refazer, em reposicionar. Normalmente, quando há o desconforto há uma refração para equilibrar o desconforto. São palavras pontuais e muito importantes”. Galindo comentou que trouxe a temática da sociedade plural devido ao texto que leu sobre a grande quantidade de vozes que ganharam força nos dias de hoje. “Temos muitas vozes, mas quem está ouvindo?”, indagou o professor. Para concluir, Galindo comentou sobre a preocupação do consumidor cidadão. O consumidor cidadão é um consumidor consciente, preocupado com o “bem-estar social do consumo”, que é “um consumo mais crítico dos produtos da nossa sobrevivência, desde a alimentação, até a educação, etc.”.

Depois de desfeita a mesa de aberturas, o professor Fábio Mariano Borges, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da ESPM, falou sobre Indignação e NetAtivismo: Consumidor Cidadão.  Borges trouxe casos de algumas propagandas de marcas e como foram as repercussões delas na internet, principalmente duas campanhas que não foram bem recebidas pelo público.  Enquanto a primeira recebeu as críticas e deletou a propaganda das redes, a segunda se retratou publicamente, retirou o produto do catálogo e se comprometeu com um ciclo de palestras sobre igualdade racial. Segundo Fábio, a segunda reação é a que está em maior sintonia com as novas atitudes no consumo. Mesmo que as agências e as empresas tentem desaparecer com as propagandas, Borges comentou que “hoje a memória digital não apaga. A gente não lembra, mas a rede lembra a gente”.

As ações consumeristas, movimentos políticos no campo do consumidor, partem de denúncias e geram as discussões na rede. As críticas se tornam, geralmente, associados a movimentos de esquerda, apesar de não estarem sempre sob a bandeira dos movimentos sociais, e são assumidos pelas plataformas e discursos políticos. Tal mudança está ligada a ressignificação do consumo e do capitalismo quando, das décadas 1980 e 1990, os consumidores eram desvalorizados e passam a adquirir força devido à classe média, que é o momento atual do “poder do um”. Uma abrangência e poder de voz dada pelas redes sociais, que diminui a importância da quantidade e se rende à qualificação do sujeito.

Por fim, ele comenta que a reflexividade do consumidor contribui para a formação de um modelo mental de consumo responsável e gera uma nova forma de pensar o consumo: consumo não só como compra, nem somente significado. Ele está atrelado às práticas.

O segundo painel tratou da Pluralidade de representação de gênero: um fenômeno social e mercadológico e foi apresentado por Renata Barreto Malta, da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Renata comentou sobre a construção do gênero, sob a ótica de Simone de Beauvoir. Segundo a professora, Beauvoir comenta que o gênero não é biológico e não se manifesta naturalmente, ele é construído culturalmente. Para dialogar com ela, Malta também traz a teoria queer de Judith Butler, que trata das mulheres que não estão no corpo feminino, e diz que a representação desses modelos são de extrema importância, já que a construção é feita tanto pelos biotipos quanto pelos fenótipos e a veiculação de diversas possibilidades representativas legitima a sua existência na sociedade. “Quem tem o poder de representar tem o poder de definir e determinar a identidade: Quem eu sou? Quem eu poderia ser? Quem eu quero ser?”, comentou a professora.

Ao longo de sua pesquisa, Malta identificou 3 modelos de propagandas: as que mantém o padrão dominante de representação, as que ficam no meio termo, no campo do politicamente correto e que trabalham com uma pluralidade limitada e, por último, as que procuram quebrar estereótipos nas representações de gênero.

O último painel foi guiado por Marcos Nepomuceno Duarte, da Universidade Mackenzie, e comentou sob o tema Pluralidade já não bate à porta, ela está dentro de casa: comunicação em tempos de pluralidade. Marcos abriu sua fala comentando sobre as proximidades de comunicação de mercado, publicidade e design e continuou refletindo sobre os casos que recebeu durante os anos 5 que trabalhou na ouvidoria do Mackenzie, do início de 2011 ao início de 2016. Segundo Duarte, a universidade entende que a ouvidoria como parte de comunicação da instituição, que deve interagir com a assessoria de imprensa e o marketing.

Os casos que Marcos atende na ouvidoria podem ser divididos em três eixos: 80% de queixa sobre cobrança. Depois disso, questionamentos do funcionamento interno – notas, professores e etc. e também questões relacionadas às minorias e às discriminações. Ao total, das 1.800 queixas recebidas anualmente, 10% eram casos realmente delegados à ouvidoria e desses casos, apenas 10% eram casos que precisavam de mais detalhamento. Ou seja, 18 dos casos. “Mesmo não sendo quantitativamente expressivos, esses poucos casos tem um potencial explosivo de gerar uma crise de imagem, já que estão geralmente ligados a coletivos e a movimentos sociais”, comentou Duarte. Marcos citou o caso de alunas da arquitetura que coletaram frases machistas dos professores do curso, fizeram um painel com o material coletado e o fixaram às 11h na universidade. Ao meio-dia os meios de comunicação já pediam um posicionamento oficial da universidade.

Duarte concluiu sob o questionamento: “nossas formulações da ideia de mercado não estão equivocadas?”. Trazendo as visões do mercado como espaço inerentemente capitalista que comercializa bens e serviços, Marcos comenta que atualmente é possível visualizar no mercado uma multiplicidade de formas. “Antigamente o mercado era o local físico onde mercadores se encontravam para comprar e vender seus produtos, hoje os economistas descrevem o mercado como conjunto de compradores e vendedores que efetuam transações relativas à um determinado produto ou classes de produto”, ou seja, a ideia é ensinada de maneira restrita e prejudica a administração de algumas empresas, que confundem os desejos do indivíduo com as necessidades do cliente. Marcos viu o problema na prática quando percebeu que a universidade não via o aluno além do espaço da matrícula e das mensalidades, quando, na verdade, ela precisa estar sintonizada com seus hábitos e ideias.

Depois dos painéis, o evento abrigou a discussão de quatro Grupos de Trabalho (GTs), conforme destacados abaixo:

GT1 – Comunicação e Consumo. Coordenação: Profª. Dra. Selma Felerico (ECOM/Mackenzie);

GT2 – Comunicação de mercado e redes sociais online. Coordenação: Prof. Dr. Alexandre Marquesi (ECOM/Umesp);

GT3 – Mídia e inovações. Coordenação: Profa. Ms. Raquel Prado (ECOM/Anhembi-Morumbi);

GT4 – Iniciação científica. Coordenação: Profa. Dra. Vânia Braz Oliveira (ECOM/Univap).

A relação completa dos trabalhos apresentados em cada Grupo de Trabalho (GT) pode ser conferida no site do evento: http://portal.metodista.br/ecom/trabalho

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