Metodista pesquisa como o uso excessivo de aplicativos afeta concentração no trabalho
15/02/2016 14h20 - última modificação 18/02/2016 13h32
A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo acaba de aprovar projeto de estudo do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Metodista de São Paulo que vai enveredar pelo fascinante – e preocupante – mundo da internet e seu impacto nas corporações. Com o título “Uso excessivo de Tecnologia de Informação e seus reflexos no ambiente de trabalho”, o coordenador da pesquisa, professor Alexandre Cappellozza, pretende investigar como os recursos tecnológicos podem gerar impactos negativos no desempenho nas empresas.
Um braço da pesquisa já foi apresentado em dezembro último na forma de dissertação de mestrado de Leonardo Mairene Muniz. Orientado pelo professor Cappellozza, o estudo conclui que pelo menos 15% da distração ocorrida no ambiente de trabalho dos profissionais investigados é explicada pelo uso compulsivo de dispositivos como Whatsapp, Facebook Messenger e Skype.
“O acesso cada vez maior à Internet permitiu alterações relevantes no cotidiano dos indivíduos, organizações e sociedade. Trouxe também distrações recorrentes e outras possibilidades adversas. Queremos ampliar o conhecimento sobre a TI como fonte de reflexos negativos no cotidiano dos profissionais nos locais de trabalho”, comenta o coordenador da pesquisa e professor do PPGA da Metodista.
Menos produtividade
Há várias formas de emancipação da humanidade, uma das quais a internet e a facilidade de comunicação que trouxe ao dia a dia. Mas, assim como psicólogos alertam há anos para a tecnostress – dependência incontrolável das redes sociais na vida pessoal –, chegou a vez de gestores de empresas serem alertados sobre o uso excessivo de comunicadores instantâneos no ambiente de trabalho. A evolução dos aplicativos tem feito o mundo virtual presente nos celulares crescer em oposição à produtividade no trabalho, como mostra pesquisa de mestrado recém-concluída na Universidade Metodista.
Dos 283 profissionais avaliados, 22,2% (63) usam dispositivos digitais acima de 15 minutos por hora dentro do ambiente de trabalho. Significam 1 hora e 35 minutos dentro de um expediente comercial de nove horas. E pelo menos 15% de um grupo de 150 profissionais tidos como aficcionados perdem totalmente a concentração no trabalho porque estão magnetizados com o uso sobretudo de Whatsapp, Facebook Messenger e Skype. Foram os três campeões de preferência em uma lista de 10 comunicadores instantâneos.
“A distração eletrônica é o mais novo desafio colocado às empresas. É possível bloquear o acesso de computadores corporativos às redes e aplicativos, mas não o celular, um instrumento privado”, alertam professor Alexandre Cappellozza e o mestrando Leonardo Mairene Muniz. Metade (50,1%) dos pesquisados usam os aplicativos no expediente de trabalho acima de 5 minutos/hora.
Ficou constatado que a distração se deve muito mais à imersão do usuário do que à frequência com que passam os olhos sobre os dispositivos. Tanto assim que há quem consiga se abster: 0,9% dos pesquisados veem os alertas no celular acima de 10 vezes por hora, mas não respondem. “Os 15% de usuários que perdem a concentração no trabalho ficam totalmente imersos nas tecnologias móveis para uso pessoal”, atesta Leonardo Muniz.
“Com a imersão, você interrompe totalmente o que está fazendo para interagir. Com a frequência, você dá uma rápida olhada e adia a resposta ao emitente”, acrescenta professor Cappellozza.
A pesquisa foi realizada em meados de 2015 e a dissertação foi defendida em dezembro último. Dos 321 questionários, 283 foram validados porque atendiam a pré-requisitos como estar trabalhando há pelo menos seis meses e ter mais que 18 anos de idade. A média de idade foi de 33 anos e o grupo foi equilibrado no gênero (47% homens, 53% mulheres). Todos usam comunicadores digitais há mais de um ano, isto é, são usuários experientes. Dos 10 comunicadores listados na pesquisa, o aplicativo campeão em uso é o Whatsapp (90,1% da preferência), seguido do Facebook Messenger (62,2%) e do Skype (33,2%).
A maioria (cerca de 75% dos pesquisados) usa aplicativos móveis pelo menos uma hora ao dia, quase 34% entre uma e três horas e 10% chegam a usar mais de 10 horas. Só 25%, portanto, usam menos de uma hora por dia.
Teclar incessante
O estudo será submetido no próximo ENANPAD (Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração), este ano na 15ª edição que acontece na Bahia em setembro. Os autores também pretendem submetê-lo a revistas científicas nacionais e internacionais, planeja o mestrando Leonardo Muniz, que buscou detalhar o tema nas empresas a partir de observação da vida pessoal. “As famílias em casa, quando se reúnem, senta todo mundo no sofá e começam a teclar o celular incessantemente. Ninguém conversa mais com ninguém. É comum dentro de um mesmo ambiente mandarmos mensagem como ‘te amo’, ‘Oi olha pra mim’...”, descreve.
Quando trabalhou em uma instituição financeira, que por força de segredo de dados limitava o acesso à internet, Leonardo notou que todo funcionário novo adquiria imediatamente um smartphone para acessar privadamente a web, tal a necessidade de todos estarem conectados com seus relacionamentos pessoais. “A partir daí, percebi como as pessoas perdiam a concentração no trabalho e a interação com a equipe para ficar no celular durante o expediente de trabalho”.
Se a distância da internet e dos celulares também se estreitou no ambiente corporativo, outras variantes não se confirmaram na pesquisa da Metodista. A chamada distração eletrônica não acarretou isolamento social. “A princípio desconfiávamos que as pessoas que não se entrosam em um grupo têm na origem o uso frenético do celular. Mas elas não se isolam. Ficam em outro ambiente mental, porém estão ali presentes, respondendo se forem demandadas”, explica professor Alexandre Cappellozza.
Apesar da sociedade atual imersa nos dispositivos móveis, ainda não foi possível detectar se dentro do trabalho o celular é uma fuga. “Muitas vezes o uso pode ser por timidez ou porque a pessoa não se identifica com a conversa do grupo”, complementa professor Cappellozza.
Segundo estudos clínicos no campo pessoal, os casos mais comuns de dependência tecnológica (tecnostress) estão ligados ao uso frenético das redes sociais, pesquisa no Google, troca de confidências no Whatsapp, atualização do Twitter e postagem de fotos no Facebook. Entre os principais problemas, alertam especialistas, está a perda de controle da administração do próprio tempo e doenças relacionadas ao isolamento, o que pode aumentar a demanda nos consultórios psicológicos.
Esta matéria foi publicada no Jornal da Metodista.
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