Natal: a “Nova Criação” de Deus
Inspirado em Paul Tillich
Coisa séria, não é? Já estamos no fim do ano! Já está próximo o Natal. No calendário da Igreja este tempo é o que se chama Advento, que significa vinda, e pode ser entendido como preparação para a vinda. São os quatro domingos anteriores ao Natal.
Que sentido teria para nós, uma Universidade, num contexto muito específico, em um tempo muito próprio, falar em Advento?
Talvez tenhamos que começar por perguntar: Vinda de quê? E a resposta é: Da novidade. Do novo. O novo, a novidade invade a história. Daí em diante o novo e o velho convivem e travam uma luta mortal, dentro da história.
São Paulo chama esta novidade de “a nova criação” e diz que nada mais tem importância além da “nova criação”. Se tivéssemos que dividir o mundo todo em duas parte: uma – o mundo da religião (de todas as religiões, inclusive as seculares), e outra a do mundo irreligioso, secular, nada disso teria importância última, a não ser a “nova criação”. Nas palavras dele: “pois nem a circuncisão (ou seja, o mundo da religião) é coisa alguma, nem a incircuncisão (ou seja, o mundo profano), mas o ser nova criatura”. A nova criação.
Ou seja, nenhuma religião: nem o induísmo, nem o budismo, nem o maometanismo, etc., nem mesmo o cristianismo, tem importância alguma, mas a nova criação. Nem uma teoria científica, nem uma ideologia, nem liberalismo, nem socialismo, nem pragmatismo, etc. tem importância alguma, mas a nova criação.
É essa novidade que se espera no Natal e é para ela que nos preparamos. Porém, a questão interessante é que esta nova criação, não é um discurso, não é uma teoria, não é uma organização, não é um sistema: é uma pessoa: Jesus, chamado o Cristo. Mais ainda, ele é mais que somente pessoa. Nele estão representadas todas as pessoas, mas mais do que somente as pessoas: toda a criação. Por isso ele não pregava a si mesmo, mas uma nova realidade, que ele chamava Reino de Deus, e que nós podemos chamar, sem medo de errar, de nova criação.
Qual a missão desse Jesus? Qual a missão dessa nova criação? Não é substituir tudo, terminar com tudo, impor uma nova coisa terminando com tudo o que é antigo. Não é isso. É introduzir, no meio do velho, a novidade. De modo que o antigo seja renovado desde dentro. Por quê? Porque ele mesmo é o criador. E a força da corrupção do ser humano se impôs ao projeto de Deus e também se estendeu por toda a boa criação de Deus. Por isso ele vem, como uma pessoa, demonstrar e seduzir os humanos para uma nova humanidade. Introduzir uma realidade que significa a renovação da criação. A nova criação é, assim, uma renovação. É por isso que em três palavras decisivas aparece o prefixo re: reconciliação; reunião; ressurreição.
Pensemos bem: no mais íntimo de nós mesmos, de cada um de nós, sabemos que não somo como queríamos ou como deveríamos ser. No mais íntimo de cada um de nós, sabemos que também estamos sujeitos ao que Paulo disse: “o bem que quero, não faço; o mal que não quero, esse faço”. Ou seja, no mais íntimo de nós mesmos, estamos em conflito conosco mesmos. Na aparência até a gente se suporta. É por isso que na grande maioria das vezes, ou quase sempre, vivemos na aparência. E também na aparência nos revelamos e relacionamos com o nosso próximo. E vivemos até bem. Mas se ele ou ela quiser ir além da aparência, nós o/a odiamos, porque não suportamos mostrar quem de fato somos. Ou seja, vivemos irreconciliados – conosco mesmo, com nosso próximo e consequentemente, estendemos essa irreconciliação para a criação inteira. No fundo vivemos em conflito conosco mesmo, com o próximo, com a natureza. E também com Deus. Por isso fazemos nossos rituais, os mais diversos. Religiosos ou não, para aplacar Deus. De nada adianta: fracasso total. Não podemos pagar nada, nem dinheiro, nem rituais, nem conduta boa, para vencermos este estado de conflito. “Reconciliai-vos com Deus”, diz Paulo. E isso significa apenas: aceitem a “nova criação”, na qual vocês já estão reconciliados com Deus, porque isso não depende de vocês, mas dele, e esta é a vontade dele.
Estar reconciliado é a primeira manifestação da nova realidade. A segunda é re-união. A “nova criação” é a realidade em que aquilo que estava separado se re-úne. A nova criação se manifesta em Cristo porque nele a separação nunca superou a unidade que formava com Deus, com a humanidade, consigo mesmo e com a criação. Ele manteve essa união apesar de todas as forças e de todos os esforços de muitos, que empurravam para a separação. Em Cristo se manifesta o poder de uma união inquebrantável. Quem aceita a “nova criação” se sente unido (ou reunido) a Deus, ou seja, ao fundo e ao sentido último de sua existência. É só nessa reunião que conseguimos coragem para vencer a angústia, ou o tédio, ou a náusea da existência. E isso porque conseguimos nos aceitar como somos, porque assim Deus nos aceita. O resultado é que a vida tem um centro, uma direção, um sentido. Não é verdade que todos temos um sentimento de que o mundo, assim como está, não está bem? Que queríamos algo diferente, principalmente sem as divisões sociais tão marcadas e profundas? Nada é tão característico do antigo como a separação. As divisões. E nada aspiramos tão profundamente como a cura das divisões sociais, das divisões entre indivíduos, das divisões que carregamos internamente em nós mesmos. A nova realidade, a nova criação é capaz de superar essas divisões e fazer emergir a reunião.
A última palavra é ressurreição. Ela significa que de dentro do velho, surge o novo. Da morte do antigo brota a novidade. E isso não é para um futuro remoto ou incerto. A ressurreição é o poder que faz brotar, no tempo presente, aqui e agora, a nova vida, reconciliada e reunida. É o poder que faz a eternidade emergir dentro da finitude, dando à vida e à história o seu sentido. É algo que vence a desintegração e a morte, que são características do velho, do antigo, e introduz sentido à Vida neste mesmo mundo antes desintegrado e sujeito à morte.
Esse é o sentido do Advento: nos prepararmos para receber o Novo, a Novidade, a Nova Criação. Ela vem personificada em uma pessoa: Jesus. E nos interpela.
O que significaria para sua vida viver reconciliação, reunião e ressurreição nesta perspectiva? O que significaria integrar-se à nova criação?
O que significaria para a nossa Universidade vivermos esta dimensão?
Esse é o apelo: entregue-se à nova criação. Deixe-se envolver completamente por ela ao ponto dela guiar sua vida. Deixemos a mensagem da Nova
Criação envolver e dirigir nossa Universidade. Amém.
Rev. Luiz Eduardo Prates da Silva
Mensagem apresentada na Reunião da Diretoria do IMS
08.12.2011