Colóquio discute midiativismo nas redes e metodologia interdisciplinar em pesquisas
08/09/2016 15h24
Arthur Marchetto
As diferenças nos processos comunicacionais atuais têm trazido à tona algumas discussões, como a atividade de agentes sociais e políticos nas redes e a construção de um novo espaço comunitário e também de ativismo para a reivindicação de direitos comuns. A complexidade do sistema também traz a possibilidade de diferentes áreas trabalharem juntas em uma mesma pesquisa para trazer resultados mais refinados e aprofundados.
Pensando em discutir essas questões, o Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social (PÓSCOM) da Universidade Metodista de São Paulo e o Núcleo de Estudos de Comunicação Comunitária e Local (COMUNI), com apoio da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (INTERCOM) e da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), promoveram IX Colóquio Internacional de Comunicação sob a temática “Ação social e pesquisa interdisciplinar”.
Para o colóquio, o Dr. Francisco Sierra Caballero (Universidad de Sevilla/Espanha e Diretor do CIESPAL/Equador) falou sobre “Videoativismo e novas práticas emancipadoras”. O Dr. Jorge A. González (Labcomplex e UNAM/México) apresentou “O estudo dos processos de comunicação partindo de uma metodologia interdisciplinária”.
Videoativismo e novas práticas emancipadoras
A primeira apresentação foi conduzida por Francisco Sierra, que comentou alguns resultados das pesquisas do Centro Internacional de Estudios Superiores de Comunicación para América Latina (CIESPAL), empreendidas nos últimos doze anos, sobre as tecnologias da informação e suas relações com a cidadania. A relação é feita na ligação entre cibercultura, políticas, processos e dinâmicas de apropriação, com um olhar amplo nos processos sociais e evitando a visão exclusivamente instrumental.
A pesquisa apresentou novas dinâmicas e mudanças nas relações entre a sociedade, os meios de comunicação e as formas de se chegar até a informação. Tais mudanças ocorrem a partir de um novo modelo de organização político-econômica, o capitalismo cognitivo, que é extremamente dependente da produção de informação e de capital cultural. Além disso, se baseia no princípio de conexão e de criatividade social da modernidade, que é definida pela rápida intercambialidade entre círculos. O efeito ocorre devido à uma nova economia social da comunicação, gerada dentro da estrutura e de seus processos de mediação, que criou possibilidades para um novo espaço comunitário/comum.
Neste contexto, Sierra comenta sobre o aparecimento de uma nova estética nos movimentos de contracultura e, consequentemente, uma nova subjetividade política. “Os sujeitos políticos são muito diferentes atualmente, têm outros modos de se relacionar, de fazer intervenção”, comenta Sierra, e é isso que afeta e modifica o midiativismo. Francisco Sierra usou como exemplo a inciativa do Mídia Ninja: o fluxo de seu material, a conexão em rede/conectividade social, o papel do público na iniciativa, as plataformas e o método de produção utilizados.
O atual sistema de produção apresentou dualidades e controvérsias, expostas pelo pesquisador numa lista de dez itens: a. Narcisismo e individualismo vs. socialização – como a cultura da imagem, narcisista convive com a experiência anônima da produção de conteúdo social?; b. Resiliência ou reprodução – Os novos meios criam uma nova lógica de produção ou acabam reproduzindo aquela adotada pela grande mídia?; c. Alcance e estrutura real da comunicação – Qual a real potencialidade da estrutura da rede e qual a estrutura dominante nos meios digitais? Há alguma espécie de censura na internet?; d. Ação coletiva vs. impacto midiático – Quanto uma ação coletiva pode competir com o impacto das imagens?; e. Espetacularidade vs. Consciência – Como a reificação dos processos sociais pela sociedade do espetáculo, que prioriza o impacto da imagem, afeta o conteúdo social do produto desenvolvido?; f. Arte pública e racionalidade instrumental – Qual o papel da imagem na arte pública no midiativismo, tanto nos movimentos urbanos quantos nos rurais?; g. Articulação vs. autonomia – As articulações incluem a diversidade? São produzidos por grupos autônomos e isolados ou por grupos conectados e articulados? O grupo é retroalimentado pelo conteúdo, ou o material circula por um grupo maior?; h. Alternativo vs. independente – Quais são as novas delimitações entre as duas produções e seu alcance?; i. Produção cooperativa vs. divisão social do trabalho criativo – Existe uma divisão social do trabalho na produção ou ela é cooperativa e co-gestada?; j. Uso social vs. supervalorização da imagem - Até que ponto a imagem é supervalorizada e o cinema é utilizado como reforço do capital? Qual o valor de uso da imagem? Há uma reificação do midiativismo?
Por fim, Sierra comentou sobre os golpes midiáticos que estão sendo pesquisados no CIESPAL e ressaltou alguns pontos que caracterizam a chamada “privatização do campo do bem comum”. O primeiro ponto é que a fonte primária de informação é a TV e, como os meios estão cada vez mais hiperconcentrados, se restringe o acesso às outras informações. Além disso, os meios de comunicação não estão mais nas mãos de grandes famílias e são, cada vez mais, companhias regidas por grupos do capital financeiro.
O estudo dos processos de comunicação partindo de uma metodologia interdisciplinária
Jorge González fez a segunda apresentação do colóquio e explicou como funcionam e quando trabalhar com metodologias interdisciplinárias. Primeiramente, uma metodologia interdisciplinária só se utiliza ao tratar de sistemas complexos. Um sistema complexo é caracterizado por possuir muitos componentes, interações intensas, muitas escalas, comportamentos comuns, conforme exemplo apresentado na imagem abaixo:
Sendo assim, os conhecimentos só podem ser classificados como interdisciplinares “a posteriori”, ou seja, só podem ser designados como tal depois de um estudo prévio que demonstre a existência de todos os elementos enumerados. O exemplo utilizado por González é o do campo da comunicação.
Quando as características são encontradas e o estudo já se caracteriza como um estudo multidisciplinar é preciso montar uma equipe multidisciplinar, com diversos profissionais de diversos campos para pesquisar um assunto e, em seguida, definir três pontos em conjunto: primeiro, um marco epistémico - fazer uma lista de todas as perguntas que são possíveis de serem respondidas. Depois, definir um marco conceitual. Qual a “cultura científica” utilizada para responder as perguntas? Quais das perguntas listadas devem ser feitas? Por último, o marco metodológico, para definir os caminhos que deverão ser traçados para responder cada pergunta.
Os resultados de cada pesquisa ficam intrinsicamente ligados com as formas sociais em que o conteúdo foi pesquisado, com o espírito do seu tempo e acabam se relacionando com os mecanismos construtivos, passíveis de revisão e aprofundamentos em diversos estudos, seguindo imagem abaixo.