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Protestantismo ignorou característica brasileira, lamenta professor sobre golpe militar

24/09/2014 16h35 - última modificação 29/09/2014 16h27

Um  fato que comprometeu a história do protestantismo no Brasil foi a incapacidade de perceber as peculiaridades da população brasileira, cuja formação ibérico-católica diferiu da norte-americana. Isso inibiu o papel transformador que teria exercido no âmbito social brasileiro. “As igrejas protestantes se tornaram espaço de negação do modo de ser brasileiro, por isso queriam tanto combater o catolicismo”, lamentou o professor Zwinglio Motta Dias, da Universidade Federal de Juiz de Fora, pastor da Igreja Presbiteriana Unida no Brasil e militante no movimento ecumênico. 

Foi esse distanciamento das marcas culturais e políticas brasileiras que teria influenciado a pronta adesão das igrejas evangélicas ao golpe de 1964, com a presbiteriana à frente devido à preponderância que detinha sobre a classe média da época e ao prestígio nos meios militares. “Oficiais de alta patente eram presbíteros, entre os quais Carlos Alberto Brilhante Ustra”, citou Zwinglio sobre o chefe do aparelho repressor DOI-CODI entre 1970-74. O professor falou na primeira noite da XVIII Semana de Estudos da Religião, que neste ano aborda o tema “Religião e Poder: Os 50 anos do Golpe Militar” e se realiza em 23, 24 e 25 de setembro.

 

Resistência


 O alheamento das igrejas evangélicas e protestantes sobre a realidade nacional, se por um lado induziu setores conservadores a legitimar a ação militar, por outro criou resistência ao golpe que fertilizou um terreno de comunidades eclesiais alternativas ou independentes. “A postura de adesão oficial foi uma, a movimentação das bases foi outra”, historiou o pastor, que foi perseguido, preso e viveu até 1979 na Europa, onde doutorou-se em Teologia na Alemanha. A oposição aos militares teria surgido da perseguição que os discordantes do golpe passaram a sofrer, expulsos de igrejas e escolas sob acusação de “comunistas”.

“Começou a surgir, embora de forma fragmentada, uma movimentação no interior das igrejas e de organizações leigas questionando o princípio protestante de qual seria o papel da igreja diante do novo status militar”, citou Zwinglio Motta Dias, lembrando que historicamente os protestantes defendiam reformas de bases, como a agrária, eleitoral, administrativa e política, em busca de uma sociedade mais justa.

No entender do professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, houve pelo menos dois legados marcantes do processo de resistência: o surgimento do CEI (Centro Evangélico de Informação), que difundia informes sobre ações oposicionistas ao que foi denominado “nova ordem” e mais tarde, em 1974, deu origem ao CEDI (Centro Ecumênico de Documentação e Informação). O segundo fato marcante, a seu ver, foi o surgimento em 1978 da Federação Nacional de Igrejas Presbiterianas, semente da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil, de tendência teológica liberal e pluralista.

Na visão do professor Zwinglio, foi a partir da ausência de uma cultura protestante originalmente brasileira – ausência suprida por fundamentalistas e a tentativa de impor um recorte próprio da Bíblia – que se originou no País uma religiosidade utilitarista, “um negocismo com o sagrado” dos neopentecostais.

 

Programação

 

O golpe de 64 foi eleito tema de reflexão deste ano na XVIII Semana de Estudos da Religião porque, nesse período, as instituições religiosas e as igrejas cristãs, em particular, tiveram papel ambíguo. Por um lado, apoiaram ideologicamente o regime militar, por outro se constituíram justamente em espaços de organização de resistência. Essa cisão marcou profundamente o mundo eclesiástico no Brasil no período e traz marcas até os dias de hoje.

Além do professor Zwinglio, participaram do primeiro dia do evento os professores doutores Jorge Atílio Silva Iulianelli (Koinonia) e Leonildo Silveira Campos (Universidade Metodista). À tarde falaram os professores doutores Joanildo Burity, da Fundaj (Fundação Joaquim Nabuco), e Dario Paulo Barrera (Universidade Metodista), que abordaram o tema “Religião e poder em perspectiva sociológica”.

Na quarta-feira, 24 de setembro, falam no painel da manhã sobre “Religião, Poder e Cultura Popular” os professores doutores Dennis Dickerson (Vanderbilt University, EUA) e Helmut Renders (Universidade Metodista). À tarde o tema versa sobre “A questão dos povos originários na América Latina”, com os professores doutores Roberto Zwetsch (EST) e Lauri Emílio Wirth (Universidade Metodista). À noite, com o tema “Religião e poder na diáspora”, a convidada é a Profª Drª Dianne Marie Stewart 
(Emory University, EUA).

Dia 25, a programação prevê palestra pela manhã sobre “Questionamentos e articulações do poder na Bíblia”, conduzida pelos professores doutores Haroldo Reimer (UEG) e Tércio Machado Siqueira (Universidade Metodista). Às 14h, a conferência de encerramento versará sobre “O poder do capitalismo e a religião”, com o Prof. Dr. Michel Löwl (Centre National de la Recherche Scientifique, França).

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