Metodista presencia ato de repatriação do acervo Brasil: Nunca Mais
15/06/2011 18h15 - última modificação 15/06/2011 18h19
O procurador geral da República, Roberto Gurgel, recebe, em ato simbólico, o acervo Brasil: Nunca Mais. Crédito: Mônica Rodrigues
A Procuradoria Regional da República (São Paulo) sediou, nesta terça-feira, 14 de junho, o ato público que marcou a repatriação de documentos do acervo “Brasil: Nunca Mais”. Os documentos, que evidenciam violações dos direitos humanos, foram coletados clandestinamente durante o período do regime militar. O material foi mantido no exterior pelo Conselho Mundial de Igrejas (CMI), em Genebra, Suíça, e pelo Center for Research Libraries (CRL), em Chicago, Estados Unidos. A Universidade Metodista de São Paulo esteve presente juntamente com sua Faculdade de Teologia (FaTeo).
O arquivo trazido do CRL, onde foi mantido por 26 anos, consiste em 543 mil rolos de microfilme, que totalizam 1 milhão de páginas de 707 processos. Há informações sobre 1.843 vítimas, incluindo mortos e torturados que sobreviveram.
O lote remetido do CMI totaliza 3.500 documentos com os bastidores do projeto “Brasil: Nunca Mais”, que inclui detalhes sobre a articulação do então cardeal-arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns e o pastor da Igreja Presbiteriana, Jaime Wright, com o Conselho e o Movimento Ecumênico. O projeto foi responsável por denunciar, ainda durante o regime autoritário, a prática de tortura e de outras violações de direitos humanos, chegando ao nome de 444 torturadores.
O subprocurador geral da República, Aurélio Virgílio Veiga Rios, coordenou o Ato de Entrega dos Acervos. “As gerações futuras precisam saber de toda essa história e sua verdade, para que ela não perca sua importância e a sua memória permaneça”, afirmou o subprocurador.
O secretário geral do CMI, pastor Olav Fykse Tveit, da Noruega, fez a entrega dos documentos que estavam em posse do Conselho. O pastor disse que “o material trazido é um testemunho da bravura dos brasileiros, da sociedade civil e das igrejas, que examinaram uma documentação relativa às infrações aos direitos humanos desse País e que agora retornam como um sinal de que a paz e a justiça podem ser obtidas. Para os brasileiros, é muito importante ter acesso a essas informações e saber, realmente, o que aconteceu, por que e como aconteceu”.
A partir da entrega dos documentos e dos microfilmes às autoridades brasileiras, foi dado início ao projeto “Brasil: Nunca Mais Digital”, que consistirá em um site que disponibilizará o acesso ao conteúdo da documentação que será digitalizada.
Um dos momentos marcantes da cerimônia foram os depoimentos de Anivaldo Padilha, membro da Igreja Metodista, e Eliana Rolemberg, membro da Igreja Luterana, que foram presos e torturados no regime militar. Padilha e Eliana relataram as torturas a que foram submetidos e quais as sensações tiveram.
Emocionado, Anivaldo Padilha contou que, em determinado momento, “o suicídio parecia ser o único caminho, pois se pagasse o preço para salvar minha vida (entregar os amigos), eu não conseguiria conviver com o profundo sentimento de culpa que me acompanharia para sempre”.
Mas ao ver que não havia forma de cometer suicídio, Padilha disse que fez uma revisão de sua vida, principalmente de seu desenvolvimento pessoal na igreja. “Tomei conhecimento de que minha vida não mais me pertencia, pois eu a havia dedicado inteiramente às exigências de minha fé. Tirá-la, seria como pedir a devolução de algo que eu havia doado, minha vida pertencia a Deus. Tudo isso me fez encontrar as forças necessárias para resistir”.
Entre suas experiências traumáticas, Eliana, que estava aprisionada com o mesmo grupo de Padilha, contou que cada vez que um companheiro era levado para interrogatórios, o grupo cantava a canção Suíte dos Pescadores, de Dorival Caymmi, que significava que os demais companheiros estariam em intercessão pelo amigo retirado e com a esperança de que ele voltasse. Ao final de sua fala, Eliana foi aplaudida ao som da canção de Caymmi, cantada pelo público presente.
Saiba mais sobre o Projeto Brasil: Nuca Mais Digital, no site do Ministério Público Federal. Veja também, mais relatos de Anivaldo Padilha, declarações do professor da Metodista, Leonildo Silveira Campos, e outros membros da Igreja Metodista e demais Igrejas Protestantes, na reportagem da revista Isto É.
Veja aqui as fotos do Ato Público de repatriação do acervo Brasil: Nunca Mais.