“Jeitinho” brasileiro de fazer novela
Por Priscilla Sampaio
Não se pode negar que, em matéria de telenovela, o Brasil é mais do que referência. Sendo uma das maiores produtoras do gênero na América Latina, a TV Globo representa o país no exterior e exporta suas novelas desde 1973, mostrando para o gringo a cultura brasileira e outras culturas, causando identificação com telespectador.
Considerada uma das paixões do brasileiro, a novela se consolidou como um dos principais produtos culturais de exportação do país, assim como os filmes de Hollywood. Exibindo o cotidiano, os traços e valores dos brasileiros e de outros países, as novelas levam um pouco da multiculturalidade brasileira para os países estrangeiros. “Não se pode deixar de reconhecer que a novela, junto ao futebol e ao carnaval, tem permitido uma maior presença do Brasil no mundo”, diz a especialista na área de internacionalização midiática e ex-docente da USP, Anamaria Fadul.
Nessas quatro décadas a Globo vendeu não só o produto finalizado como também o conceito de produção, um know-how que elevou o padrão das telenovelas.
Começo glorioso
Nos anos 70, a TV Globo abriu o mercado de exportação de telenovelas e vendeu a trama “O Bem Amado”, de Dias Gomes, para uma emissora uruguaiana. Foi a primeira novela brasileira finalizada a chegar em território estrangeiro, até então as emissoras só comercializavam textos.
Estas primeiras décadas de exportação do gênero representaram um momento bastante próspero e único para a Rede Globo, como explica a pesquisadora e professora do programa de pós-graduação da ESPM – Escola Superior de Propaganda e Marketing, Marcia Tondato. “Podemos dizer por uns 20 anos que fomos top de mercado, até porque praticamente somente o Brasil, leia-se Rede Globo, tinha uma capacidade de produção para atender ao mercado externo.”
Três anos após a entrada da emissora carioca no mercado televisivo internacional, estréia a novela que se tornaria uma marco nas exportações do canal: “A Escrava Isaura”. A novela de Gilberto Braga, com texto adaptado da obra de Bernardo Guimarães, chegou a ser exibida em mais de 70 países e esta no ranking das novelas mais exportadas, até hoje, pela emissora.
Nos anos 80 , A Escrava Isaura foi vendida para países do bloco comunista como China e Cuba, e protagonizou momentos curiosos, como conta a jornalista e autora da monografia “Exportação de Telenovelas – A Venda do Know How”, Amanda Wanderley: “Em 1984, o sucesso foi tanto que o racionamento de energia foi suspenso pelo governo cubano para que os telespectadores pudessem assistir a história.”
Outro episódio envolvendo a história da escrava branca foi a ida de Lucélia Santos, interprete de Isaura, para a China. Lá, a atriz foi agraciada com Prêmio Águia de Ouro por sua atuação, tornando-se a primeira atriz estrangeira a receber uma premiação naquele país.
Após quase 35 anos, "A Escrava Isaura" continua sendo exportada, porém, perdeu a liderança do ranking para produções mais atuais, como “O Clone” e “Da Cor do Pecado”, que foi exibida em mais de 100 países.
O mercado atual
Por muito tempo, as tramas brasileiras reinavam sobre as produções estrangeiras do gênero, pois poucas emissoras latinas tinham estrutura para produzir novelas. Porém, emissoras gringas como a americana - voltada para o público hispânico – Telemundo e a mexicana Televisa começaram a investir em produções locais.
Hoje, o mercado evoluiu, estimulando parcerias entre emissoras e um intercâmbio não só da novela finalizada, mas também do chamado know-how.
Esse “modo de fazer” funciona com uma parceria entre as emissoras e torna a produção mais personalizada, como explica Amanda: “Normalmente, o vendedor contribui com o know-how criativo, a pré-produção e o acompanhamento de todo o processo de produção, e o comprador fica responsável pela adaptação do roteiro, pela gravação em estúdios próprios com atores locais". O resultado disso é a qualidade da novela, completa Amanda. “O produto ganha com a qualidade de produção de quem sabe fazer, mantendo-se próximo ao público alvo ao falar o mesmo idioma dos telespectadores – a principal demanda da audiência”.
Um exemplo de venda de know-how feita pela Globo ocorreu em 2001, quando a emissora assinou um contrato de parceria com a Telemundo. Amanda afirma ter sido a primeira vez que Globo se dedicava a produções cujo foco era apenas atender ao mercado externo. Até então, apenas dublava e cortava suas novelas para adaptá-las aos mercados locais.
Segundo a última coluna de Cristina Padiglione, divulgada no Estadão, a nova investida da Globo é “Avenida Brasil”. Apresentada no evento de comércio de conteúdo audiovisual Discop West Asia e no último National Association of Television Program Executives (NATPE), a trama de João Emanuel Carneiro foi a maior audiência de 2012.
Foram várias novelas exportadas e exibidas em mais de 100 países. Fazendo um balanço dessas quatro décadas, a TV Globo com o “jeitinho” brasileiro de fazer novelas, conquista cada vez mais mercado internacional. E a criatividade da teledramaturgia brasileira é a personagem principal dessa história.