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Danilo Angrimani Sobrinho

Por Arquimedes Pessoni

Danilo Angrimani Sobrinho.

Data e local de nascimento: São Paulo, 17 de janeiro de 1953, SP, Brasil.

Formação universitária – Pós-doutorado Ciências da Comunicação pela Universidade Metodista de São Paulo – Cátedra de Gestão de Cidades (2013), em Doutor em Ciências da Comunicação pela ECA/USP (1993), orientado pelo Prof. Dr. Ciro Marcondes Filho, com passagem pela Sorbonne/Paris V (1991/1992), sob a orientação do Prof. Dr. Michel Maffesoli. Título do pós-doc - A cultura rústica urbaniza-se: um estudo sobre os caboclos de Piedade do  Paraopeba em intersecção com os caipiras do Rio Bonito (2013); Título da tese – Espreme que sai sangue, um estudo sobre a imprensa sensacionalista, tendo como objeto o jornal Notícias Populares; Mestre pelo Instituto Metodista de Ensino Superior (1985), dissertação – Televisão e Comunidades Rurais – o caso de Piedade do Paraopeba, Palhanos, Minas Gerais, orientado pelo Prof. Dr. Luiz Roberto Alves; Bacharel em Jornalismo pelas Faculdades Integradas Alcântara Machado (Fiam/1980); Bacharel em Letras pela Faculdade Paulistana (1977); Ensino médio (Colégio Arquidiocesano); Ensino Fundamental (Liceu Pasteur).

Atuação profissional – Sócio da empresa Escritório de Mídia (2005 – atual), jornalista no Diário do Grande ABC (até 2005), Repórter especial do Jornal da Tarde (Grupo O Estado de São Paulo), repórter especial e editor da Economia do Diário do Grande ABC (1993/2000); pauteiro da Folha da Tarde (1990/1991); repórter especial e editor do caderno Revista do Diário Popular (1984/1990), repórter da produtora de jornais de empresa Proal Assessoria Empresarial (1978/1980 e 1983/1984); assessor de imprensa da Agência Salles/Honda Motor do Brasil (1979/1980); redator da revista Escrita de Literatura (1977).

Experiência acadêmica – Professor de Jornalismo no Instituto Metodista de Ensino Superior (1984/1989); professor de Técnica de Jornalismo e Edição no Departamento de Jornalismo da Universidade de Mogi das Cruzes (1997/2000).

Prêmios e distinções – menção honrosa no Concurso Histórias dos Bairros de São Paulo, promovido pela Prefeitura de São Paulo, em 1984.

Públicações

Livros publicados – Espreme que sai sangue, um estudo sobre o sensacionalismo na imprensa (1995); Nicola (romance/1999); Vila Clementino, memórias de um bairro (2000/Menção honrosa no Concurso Histórias dos Bairros de São Paulo, promovido pela Prefeitura de São Paulo, em 1984.

ArtigosEm busca do tempo perdido e da memória, a tarefa do Núcleo de Estudos da Memória Popular do ABC (Comunicação e Sociedade, A comunicação do ABC, dezembro de 1983, número 10); Uma Copa, um Zagallo e os “seres inferiores” (Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, SP, vol. XXI no.2 – julho/dezembro-1998, p.153-156.

CAPELLI, James ; MASIERO, I. ; ANGRIMANI Danilo. Crianças e Adolescentes Abrigados - um olhar sobre a situação de abrigamento, com base em depoimentos obtidos no Lar São Francisco de Assis, em Santo André (2005/2008). 1ª. ed. São Bernardo do Campo: Escritório de Mídia, 2008. v. 1.000. 198p .

Influências intelectuais – Fase ParticipativaNa primeira etapa de sua formação acadêmica, Dalino Angrimani seguiu bastante o pensamento de seu orientador, Luiz Roberto Alves, que trabalhou (e prossegue atuando até hoje nesta linha) com o resgate da memória e a adoção do  método de pesquisa participante para o levantamento de informações sobre os objetos em estudo. Poderíamos afirmar que, para desenvolver sua dissertação de mestrado, Angrimani bebeu da fonte da Escola de Frankfurt, sobretudo do neomarxismo de Theodor Adorno, que tinha como objeto de estudo a mensagem na comunicação de massa. A afirmação de Adorno de que “qualquer indivíduo é engolido pela sociedade deixando de ser ele próprio e agindo conforme as regras da sociedade” por diversas vezes é comprovada por Angrimani em seus estudos quando analisa a influência da TV na população objeto de sua pesquisa. A diferença é que Adorno via só o lado negativo da Indústria Cultural em seu estudo, enquanto Angrimani identifica pontos negativos e também alguns positivos.

Esta constatação do autor o coloca em contato com o pensamento da escola Sociológica Européia, principalmente com Umberto Eco, com quem diz concordar ao ouvir o testemunho de um grupo de moradores de Piedade do Paraopeba que confirmam o pensamento e Eco ao afirmarem que “a televisão é um instrumento que, de um modo ou de outro, apresenta violentamente novas formas de vida, realidade sociais diversas, fenômenos muitas vezes incompreensíveis, mas carregados de prestígio – o advento de um fenômeno que leva de chofre o espectador a chocar-se com dimensões inesperadas, fazendo-o entrever mil possibilidades – tudo isso não pode deixar de resolver-se num momento qualquer; e o movimento, curiosidade, despertar são fases pedagogicamente positivas para grupos humanos adormecidos em resignações seculares e insanáveis”.

Outros autores/obras que influenciaram este trabalho de Angrimani no mestrado foram Luis Augusto Milanesi (O Paraíso Via Embratel); Antonio Cândido (Os parceiros do Rio Bonito) e Carlos Rodrigues Brandão (Pesquisa Participante).

Fase sensacionalista – Na segunda etapa de produção intelectual de Danilo Angrimani, seu interesse se debruçou sobre o tema sensacionalismo, mudando bastante seu referencial teórico. Nessa fase, Angrimani foi bastante influenciado intelectualmente pela linha de pesquisa de seu orientador Ciro Marcondes Filho (USP) que trabalha com autores que utilizam a análise dos fenômenos comunicacionais em áreas não específicas da comunicação, sobretudo a psicanálise.

Neste trabalho de Doutoramento são bastante citados Sigmund Freud e seus conceitos de id, ego e superego; Alfred Lorenzer e a utilização múltipla da linguagem-clichê e os recursos que ela oferece para transformar uma informação em material sensacionalista; Dieter Prokop que preocupa em “desmontar” o conteúdo dos produtos de comunicação de massa para identificar os signos, fantasias-clichês e estereótipos; Otto Fenichel com suas teses sobre o superego apontadas na Teria Psicanalítica das Neuroses, além do próprio trabalho com signo e clichês do orientador Ciro Marcondes Filho.

É importante salientar a influência dos pensamentos de seu co-orientador Michel Maffesoli e das inúmeras obras citadas na bibliografia da tese de doutorado, na sua maior parte em francês. Desses autores, o próprio Angrimani destaca Georges Auclair, Jean Bergeret, Rger Caillois e Jean Cazeneuve como fundamentais na constituição de seu pensamento comunicacional.

Experiência internacional – Bolsa-sanduíche de doutoramento em (Sorbonne), Paris (1991/1992).

Línguas que domina – Inglês e Francês, em cursos realizados de língua francesa na Universidade de Nancy (setembro de 1981 a fevereiro de 1982); Língua inglesa na Davie´s School of Brighton, Inglaterra (janeiro a agosto de 1981); Língua Inglesa na Universidade Farleight Dickinson, em New Jersey (julho/agosto 1986).

Endereço eletrônico: escritoriodemidia@uol.com.br

O jornalista Danilo ANGRIMANI Sobrinho, paulistano nascido em 17 de janeiro de 1953, casado, dois filhos, pertence à geração dos Renovadores no grupo dos pensadores comunicacionais brasileiro. Bacharel em Letras pela Faculdade Paulistana (1977), em Jornalismo pelas Faculdades Integradas Alcântara Machado (Fiam/1980), iniciou sua carreira na área de Comunicação no mesmo ano em que se formou no curso de Letras (1977), trabalhando como redator da Revista Escrita de Literatura. Durante e após o curso de Jornalismo, atuou como repórter na Produtora de Jornais da Empresa Proal Assessoria Empresarial (1978/19680 e de 1983/1984) e foi também assessor de imprensa da Agência Salles/Honda Motor do Brasil (1979/80).

Sua inserção no mundo da pesquisa acadêmica teve início em 1982, quando acabava de retorna da França e da Inglaterra, pra onde havia viajado com, o objetivo de aprender o idioma daqueles países. “Era um período crítico: politicamente não era nem noite, nem dia no Brail”, lembra-se de seu retorno Angrimani. Para se sustentar na Europa, o jornalista confesso que teve de fazer malabarismos: “trabalhei como faxineiro, ‘arrudamadeiro’, cozinho e gerente de hotel. Na França, cheguei a trabalhar em uma fazenda, na realidade uma vindima na região de Champagne”.

A volta ao Brasil foi um tanto traumática para Angrimani. Com a esposa grávida e o país no estertor da ditadura militar, havia a agravante de uma crise política e econômica desastrosa. Muita gentes em emprego, falta de investimentos e ausência de perspectiva. O jornalista lembra que diante do quadro encontrado, conseguiu arrumar trabalho temporário, fazendo “frila” para algumas publicações mas, mesmo assim, se sentia completamente despreparado para a profissão.

Foi assim que Danilo Angrimani Sobrinho resolveu mergulhar no mundo da academia. “Decidi fazer mestrado. Fui à Metodista, incentivado pelo amigo Gerson Moreira Lima, que lecionava lá e esteve na Inglaterra comigo. Fui aceito no programa de pós-graduação, dirigido na época pelo Prof. Dr. José Marques de Melo e ganhei uma bolsa Capes. Sob a orientação do Prof. Dr. Luiz Roberto Ales, que dirigia com muito entusiasmo um grupo de memória, comecei a trabalhar como pesquisador de comunidades”, lembra Angrimani.

Na época, recorda Angrimani, o professor Luiz Roberto trabalhava com pesquisa participante, com base n o livro “Pesquisa Participante”, de Carlos Rodrigues Brandão. Nessa pesquisa, o investigador não se apropria meramente dos dados dos moradores pesquisados, mas tenta devolver essa informação sob a forma de ação local. “Tratei de pesquisar uma população que conhecia muito bem, a do bairro onde fui criado – Vila Clementino”, sentencia o jornalista. Esse trabalho rendeu menção honrosa ao autor no Concurso Histórias dos Bairros de São Paulo, promovido pela Prefeitura de São Paulo, em 1984.

O trabalho – até então só acadêmico – ganhou conotação também política, como bem ilustra Angrimani. “Em 83 e 84 fiz parte de um movimento pela preservação da Casa Modernista da Vila Mariana. Havia a ameaça de se destruir a Casa Modernista, idealizada pelo mago do modernismo Gregori Warchavchick, para a construção de quatro torres de prédios residenciais. Era a pesquisa participante em alta velocidade. Organizamos um movimento de moradores que se reunia na Igreja da Saúde. Fizemos pedágio na porta da Casa, manifestações e atos públicos. A imprensa nos apoiava. Os investidores imobiliários me processaram. Na ocasião, fomos ajudados por alguns vereadores, entre eles Marcos Mendonça, Luíza Erundina e Irede Cardoso (já falecida); além de um advogado ecologista ranzinza, briguento, mas tremendamente competente, chamado Fábio Feldman. O então vereador Marcos Mendonça me conseguiu um advogado que fez minha defesa e acabei sendo absolvido do processo movido pala imobiliária. No final do curso do Prefessor Luiz Roberto Alves eu tinha produzido uma monografia sobre o bairro mas, muito mais importante do que isso, conseguimos vencer o braço-de-ferro e a casa Modernista e seu belíssimo entorno de área verde estavam salvos e preservados pela Prefeitura, estado e governo federal.”       

A publicação e a consequente premiação da monografia produzida por Angrimani só acabou acontecendo cerca de 15 anos depois disso e traz boas recordações ao autor. “Essa monografia ganhou um prêmio da Prefeitura e só seria editada 15 anos mais tarde por iniciativa do então diretor do Departamento do Patrimônio Históricos, Luís Soares de Camargo. Eu estava no Diário do Grande ABC, em setembro ou outubro de 1999, quando recebi uma ligação de Luís Soares. Ele tinha descoberto a monografia na gráfica e me avisava que o trabalho seria publicado em breve. O que de fato aconteceu em janeiro de 2000. Entre as pessoas que compareceram na noite de autógrafos estava o professor Luiz Roberto. Trocamos um abraço emocionado. Eram anos de um trabalho conjunto que se solidificava naquela noite”, relembra Angrimani.

Deixando o sucesso da monografia de lado e conhecendo um pouco melhor a proposta apresentada na dissertação de mestrado de Angrimani, podemos ver que a figura de seu orientador – Luiz Roberto Alves – foi extremamente importante para seu desenvolvimento acadêmico. Conforme lembra o próprio Angrimani, “graças ao apoio de Luiz Roberto pude realizar a dissertação sobre TV e comunidades rurais. Minha ideia era seguir a linha de trabalho de ‘O Paraíso Via Embratel’, de Luiz Augusto Milanesi. Ele havia feito uma pesquisa sobre TV em uma cidade do interior. Pensava em fazer a mesma pesquisa, porém, em um local onde a TV tivesse acabado de chegar. Por sorte, fui com um amigo passar uns dias de folga em um lugarejo distante de tudo, chama  Piedade do Paraopeba, em Minas Gerais. A TV era um fenômeno recente. Havia ainda o televizinho, muita gente não possuía TV e assistia seu programa favorito no vizinho, algo que eu vira ocorrer em São Paulo no final da década de 50, quando ainda era criança e a TV um veículo de comunicação recente. Quem  me ajudou na pesquisa de campo foi o Prof. Antonio Cândido. Não diretamente, é claro, mas com livros, obras deliciosas como ‘Os Parceiros do Rio Bonito’, que iluminaram meu caminho. A minha dissertação de mestrado misturou TV, marxismo, histórias populares e foi produzida com muita dificuldade financeira. O marxismo estava no fim, como referencial teórico, mas os acadêmicos, na época, não conseguiam aceitar essa realidade. Minha mulher, Jussara, e minha filha, Damiana, que tinha nascido e estava com dois anos, me acompanharam por aquelas estradas do sertão mineiro. A dissertação foi apresentada e aprovada. Hoje, esse trabalho poderia ser considerado um documento de valor arqueológico. Piedade do Paraopeba é agora um bairro da Grande Belo Horizonte e todos aqueles personagens, que colaboraram na minha pesquisa, desapareceram. O próprio lugarejo não existe mais como tal”, recorda Angrimani.

Bastante ligado à família, mesmo nos momentos de pesquisa acadêmica, Angrimani trilhou os caminhos da Folkcomunicação durante sua estada em campo para cartar as informações que, mais tarde, incluiria no seu trabalho acadêmico e destaca a importância das companhias, mesmo as mais estranhas, nesses momentos de solidão em Piedade do Paraopeba. “Fiquei hospedado na casa da família de meu amigo e às noites sentava na porta, coma Damiana no colo. Havia apenas uma luz fraca na soleira e a escuridão tomava tudo em volta. Noite após noite, um sapo saía da mata e saltava até chegar perto de mim e de minha filha. Eu contava histórias para ela dormir e o sapo, acho, também gostava de histórias, porque ficava quietinho junto ao degrau. Quando eu me levantava para ir dormir, o sapo voltava para a mata. Acredito que esse personagem não tem o mínimo interesse acadêmico, porém, não poderia deixa-lo de fora”, conclui Angrimani.

Após a defesa de sua dissertação, Damilo Angrimani Sobrinho se manteve afastado por três anos do mundo acadêmico, trabalhando no Diário Popular. Mesmo atuando também como professor de Jornalismo no Instituto Metodista de Ensino Superior (1984/1989), para o jornalista, a pesquisa começou a fazer falta. “A cada ano, sentia que estava me tornando medíocre, ‘emburrecendo’. No final de 87 tomei uma decisão. Decidi que era hora de completar a minha formação. Queria trabalhar com sensacionalismo”, lembra Angrimani. Sensacionalismo era o assunto do momento e muitos se preocupavam com este assunto. Num golpe de sorte, Danilo Angrimani lembrou-se do Prof. Dr. Ciro Marcondes, com quem já havia estado na Metodista e que pesquisava violência, seguindo uma linha de pesquisa fora da semiótica. Era uma tarde chuvosa de 23 de setembro se 87 quando o prof. Ciro Marcondes aceitou Angrimani como seu orientando. Marcondes trabalhava com autores como Freud, Prokop, Fenichel, Lorenzer. Danilo ingressou no programa de doutorado da Escola de Comunicação e Artes da USP, área de concentração Jornalismoe  Editoração, em 1988.

Casar a vida de jornalista com a de estudante de doutorado na USP não era fácil, como bem lembra Angrimani. “Em 90, saí do Diário Popular e entrei na Folha da Tarde, que ficava no mesmo prédio do Notícias Populares. Eu trabalhava como pauteiro da FT. Entrava às 7h no prédio da Folha da Manhã na rua Barão de Limeira. Às 17h saía da FT e ia pesquisar na redação do Notícias. Ficava lá até de noite. Em 91, eu tinha completado meus créditos, estava com a pesquisa adiantada, mas me faltava tempo para escrever a tese. Percebi que iria ‘morrer na praia’. Não conseguiria escrever a tese e perderia três anos de trabalho intenso sobre meu objeto. Entrei em contato com o Prof. Michel Maffesoli, que dirigia o Centro de Estudos sobre o Atual e o Cotidiano na Sorbonne. Maffesoli tinha a fama de trabalhar com brasileiros. Para minha surpresa, ele respondeu de maneira positiva. Aceitaria minha pesquisa na França. Pedi uma bolsa ao CNPq. No dia 11 de agosto de 91 meu pai morreu. No dia seguinte, voltei do enterro e encontrei a carta do CNPq informando que ganhara a bolsa-sanduíche para escrever a tese. Em setembro, eu, minha mulher e meus dois filhos (o Daniel nasceu em 87) nos mudamos para Paris.”

Paris talvez tenha sido o local onde a produção acadêmica de Danilo Angrimani Sobrinho foi mais intensa. “Foi um ano de muita produção. Escrevi a tese diariamente. Tive acesso à Biblioteca Nacional da França, onde ‘manipulei’ (na verdade, li pelo equipamento de microfilme) antigos jornais sensacionalistas. Tive acesso a obras de Auclair, Baillon, Romi (coletânea intitulada “Histoire des Fait Divers”) e outros autores. Maffesoli me recebia em seu belo e acolhedor apartamento no Marais. Lia as páginas datilografadas e fazia uma ou outra observação. Sempre pontuais, sempre precisas e fundamentais. Suas aulas no anfiteatro Émile Durkheim eram sempre muito concorridas. Nosso grupo de cinco ou seis brasileiros saía do anfiteatro com a ‘alma leve’”, como bem recorda Angrimani.

Quem estava no lugar anteriormente ocupado por Luiz Roberto Alves era agora seu novo orientador, prof. Michel Maffesoli. “Às vezes, eu estava ‘travado’, não conseguia avançar na tese e, depois da aula de Maffesoli, encontrava uma solução. Quando íamos ao café, no largo próximo à Sorbonne, às vezes sentava-se na mesa ao lado da nossa e – por uma vez sentou-se conosco – o agente provocador Jean Baudrillard. Imagine o que significava para mim, que nas aulas do Ciro tinha devorado todas as obras de Baudrillard, poder sentar e ficar próximo desse grande filósofo do nosso tempo. Tomava um “rouge”. Saía do café direto para o nosso apartamento da rue Fouchet, no 17eme. As páginas saiam voando da máquina de escrever. Ia esquecendo algo muito importante. Na rua onde eu morava, a um quarteirão de distância, ficava a Biblioteca do CNRS (Centro Nacional de Pesquisa – recherche – Social), dotada de obras fundamentais para a elaboração de minha tese, como “La Violence Fondamentale”, de Jean Bergeret, “Instincts et Societé”, de Roger Caillois, “Lês Rites et  La Condition Humaine”, de Jean Cazeneuve. Várias tardes estive na biblioteca colossal e muito concorrida do Centro Georges Pompidou, que os parisienses chamam carinhosamente de “Boubou”. Talvez o livro mais importante que eu li nessa época foi “Lê Mana Quotidien”, de Georges Auclair. Estava tudo ali: Freud, o meio de comunicação como veículo para a transgressão do leitor e a necessidade do leitor em vivenciar o ato proibido, mesmo que vicariamente, por procuração. Quando perguntaram a Einstein quantas ideias produzia diariamente, ele respondeu que só tinha tido uma única ideia na vida: a teoria da relatividade. Não sou Einstein, mas se me perguntassem qual foi a minha melhor ideia, eu diria que foi entender que o meio de comunicação sensacionalista é transgressivo, mas também serve como aparato punitivo para e pelo leitor. A tese de doutorado ancorou-se principalmente em Freud (conceitos ego, id, superego), em Fenichel (que descobriu que o id e o superego podem ser deslocados) e Prokop (que fez esse deslocamento psicanalítico para os meios de comunicação, discorrendo sobre signo e clichê)”, recorda Angrimani.

A defesa da tese de doutoramento foi apresentada e aprovada em 23 de setembro de 93 – “exatamente no mesmo dia, seis anos depois, em que estive conversando com o Prof. Ciro Marcondes, naquele longínquo setembro de 87”, lembra Angrimani. O trabalho rendeu a publicação de um livro homônimo Espreme que sai sangue, um estudo sobre o sensacionalismo na imprensa, em 1995. A mesma tese de Angrimani foi alvo de uma interessante discussão acadêmica, que gerou o primeiro número do “Atrator Estranho” (março/93 – nº 01 – Imprensa sensacionalista), uma publicação idealizada por Ciro Marcondes, na ECA/USP e que pode ser acessada na Internet no link http://www.eca.usp.br/nucleos/ntc/atrator.htm.

Em 1999 Danilo Angrimani lançou seu livro “Nicola”, um romance escrito entre 97 e 98 e que foi publicado pela editora GLS. Segundo o autor, seu propósito era escrever um texto provocativo sobre a sexualidade deslizante. “Nicola é um livro subversivo, perigoso, anárquico. Talvez, por isso, com exceção de publicações GLS, não conseguiu resenhas na mídia. Uma pena, fica para o próximo”, conforma-se o autor.

Perguntado sobre sua linha de pesquisa e escolas que o influenciaram, Angrimani não arrisca esta ou aquela corrente: “A minha linha de pesquisa tem a ver com psicanálise aplicada à comunicação. Algo por aí”, observa. O trabalho até agora publicado deste renovador do pensamento comunicacional serve como referência para os estudiosos da linha sensacionalista que parte da imprensa adota.

               

Dissertação de Mestrado – 1985

Televisão, Memória e Prática Cultural – O Caso de Piedade do Paraopeba/Palhano – Minas Gerais

Quais seriam as alterações em uma comunidade se ela fosse lançada rapidamente na era eletrônica, representada pelo advento da televisão, se sabemos que esta mesma comunidade não vivenciou as fases da imprensa escrita, cinema e teatro? Iniciando por esta interrogação, a dissertação foi desenvolvida, buscando, justamente com a resposta, a memória local, usos, hábitos e histórias, que remontam desde a fundação da vila até nossos dias.

1º parte – Uma breve história da televisão no Brasil

Nesta primeira etapa do trabalho, o autor mostra um breve retrospecto da história da televisão no Brasil, desde sua chegada com Assis Chateaubriand e sua consequente inauguração em 18 de setembro de 1950, em São Paulo, com a primeira transmissão feita pela PRF:3 TV Tupi Difusora de São Paulo até o nascimento da Rede Globo de Televisão e a influência dos produtos apresentados pela TV na vida das pessoas.

2º parte – O Vale do Paraopeba

O trabalho de dissertação teve início quando o autor visitou pela primeira vez determinada região do estado de Minas Gerais e tomou contato com circunstâncias especialíssimas, que poderiam ser encontradas só mesmo em um país com as dimensões e a complicada textura de problemas do Brasil, A região chamava-se Vale do Paraopeba e impressionava o visitante pela sua beleza natural. O vale situa-se entre várias cadeias de montanhas e dadas as suas características geográficas viveu um longo período de afastamento, apesar de situar-se a cerca de 50 quilômetros da capital mineira, Belo Horizonte.

Habitado por descendentes de garimpeiros e ex-integrantes da bandeira de Fernão Dias, o vale havia sofrido poucas alterações e mantinha ainda muitas das riquezas naturais existentes quando da chegada dos bandeirantes.

As circunstâncias especiais citadas anteriormente se referiam à implantação da rede elétrica na região. Consequentemente, com a eletricidade, chegaram também os eletrodomésticos e, com eles, a televisão, que passa a ocupar um lugar especial na comunidade.

Entende-se que havia um choque de forças: de um lado. O mudo caboclo, circundado pela prática cultural, suas histórias e mitos; de outro, o mundo tecnológico, representando pela televisão.

3º parte – A Convergência

Nesta parte do estudo, A Convergência, o autor entra propriamente nos resultados da pesquisa participante, ao analisar no primeiro capítulo alguns dados a respeito de Casamento, Papéis Familiares, O sexo antes do casamento, Mãe solteira, Bigamia, Celibato, Adultério, Batismo e Benção. No segundo capítulo, A Comunidade, procura-se montar um painel de constituição econômica, religiosa, fabular e historiográfica da população local. No capítulo seguinte, O Artesanato e a Indústria de Fundo de Quintal, fala-se na produção caseira de alimentos e bens de uso, dos produtos fabricados por artesãos locais, da indústria doméstica que produz sabão, azeite, rapadura, farinha e vassoura. No quarto capítulo, A Comunidade e seus problemas, tem-se a realidade da população diante da subnutrição, da falta de infraestrutura médico-hospitalar, da quase ausência de meios de transporte, da timidez e precariedade do sistema de ensino, das alternativas reduzidas do lazer, das mudanças orgânicas ocorridas na comunidade, a visão progressista dos especuladores imobiliários. No quinto capítulo, Palhano explica a televisão, a comunidade revela suas angústias e esperanças diante do mais novo veículo eletrônico incorporado à vida cotidiana.

Conclusão

O que representa a televisão para o grupo pesquisado, alguém poderia questionar. A resposta seria breve. A tevê significa lazer e proximidade com o mundo do outro lado da montanha, com Belo Horizonte – a capital – e com o mundo, diminuindo a sensação de isolamento que a Serra sempre proporcionou aos moradores do vale.

Embora o pesquisador na oportunidade do estudo entendia ser a televisão – sinônimo de Rede Globo – um emissário apocalíptico, isso não duraria eternamente. As conjunturas políticas e econômicas vigentes na época do estudo se transformariam e o veículo televisão, num futuro – talvez até próximo (lembraria o autor) – estaria exercendo um papel mais democrático, mais informativo, mais cultural e até mais digno do que exercido nos últimos 20 anos (até 1985, ocasião desta dissertação).

Tese de Doutoramento (1993)

Espreme Que Sai Sangue, um estudo sobre o sensacionalismo na imprensa – resumo

O objetivo deste trabalho é o de tentar compreender a relação entre a imprensa sensacionalista e os mecanismos inconscientes que são atendidos por esse gênero de comunicação. Investigou-se a gênese da imprensa sensacionalista, desde seu aparecimento nos primeiros veículos de comunicação até sua definição como imprensa amarela, na era Hearst e Pulitzer. A pesquisa deteve-se principalmente no jornal Notícias Populares, publicado em São Paulo, onde se constatou que existe um processo catártico entre o veículo e seus leitores. Desta forma, o veículo atua em um pêndulo inconsciente, que pode ser definido como superego acessório ou id projetado.

Notícias Populares

(*) 1963

(+) 2001

O jornal Notícias Populares, o NP, surgiu em São Paulo, em 15 de outubro de 1963, com uma proposta política definida: bater de frente com a Última Hora, que nascera nos anos 50 a pedido do governo Vargas e sob a inspiração de Samuel Wainer.

Nos turbulentos anos pré-ditadura militar, Última Hora era a publicação de esquerda, voltada para o grande público, que mais se identificava com o governo Jango, herdeiro do trabalhismo de Vargas.

A iniciativa de criar o NP foi de grupos de direita, que imaginavam um Última Hora com sinal político invertido. Estavam por trás daquela primeira edição do NP empresários como José Ermínio de Moraes Filho, Luiz Pinto Thomaz, João Arruda e – o principal deles – o então presidente da UDN, Herbert Levy.

O diretor-geral de Notícias Populares era um romeno, que tivera em seu país um jornal popular, expropriado pela revolução socialista. Chamava-se Jean Mellé, havia sido preso pelos comunistas e libertado depois da Segunda Guerra Mundial. Chegou ao Brasil como outros refugiados de guerra, com o sonho de reconstruir sua vida.

O encontro de Mellé com Levy foi providencial. Enquanto Levy precisava de alguém com experiência profissional e que tivesse horror da ameaça comunista, Mellé tinha sido vítima de comunistas em, seu país, era um talentoso colunista de Última Hora e ambicionava ter seu próprio jornal.

A primeira tiragem do NP saiu com oito mil exemplares. Desde o início, Mellé optou por um modelo que imitava as publicações sensacionalistas norte-americanas, rastreadas pelo tripé sexo, crime e escândalo. Esse gênero de sensacionalismo utiliza o fait-divers como seu principal nutriente. Fait-divers é uma palavra francesa. Refere-se àquela notícia que provoca empatia no leitor (a criança salva depois de ficar quatro dias soterrada; o casal que se mata por amor; a chuva torrencial; o incêndio no edifício; entre outras situações).

Notícias Populares é, portanto, um legítimo representante da imprensa amarela. Esse termo – imprensa amarela – remete ao ano de 1890 e aos jornais “World”, editado por Joseph Pulitzer e “Journal”, de William Randolph Hearst. Essas duas publicações brigavam pela hegemonia do mercado nova-iorquino.

Imprensa amarela e marrom

Para vender mais jornais, Pulitzer e Hearst abusavam das manchetes escandalosas, em corpo tipográfico largo; falsificavam entrevistas; baseavam-se na pseudociência para criar reportagens mirabolantes; inventava histórias (a cascata, segundo o jargão jornalístico); e promoviam campanhas supostamente em defesa “do cidadão comum”, a exemplo do que o apresentador Carlos Massa, o Ratinho, fazia até pouco tempo atrás.

Curiosamente, os dois jornais concorrentes utilizavam posters de uma história em quadrinhos, cujo principal personagem era “Yellow Kid” (Garoto Amarelo). Pintado e=de amarelo escandaloso, o Yellow Kid servia para a divulgação das edições de domingo dos dois jornais. Daí veio o termo pejorativo “imprensa amarela”, para designar aquele veículo de comunicação não necessariamente sério.

Já o termo “imprensa marrom” vem do francês e quer dizer atividade ilegal. Os primeiros jornais sensacionalistas franceses eram impressos sem licença. Seus idealizadores costumavam ser chamados de “imprimeur marron” (impressor ilegal). O termo “imprensa marron” ainda é utilizado na França para jornais sensacionalistas e foi largamente empregado no Brasil também.

Ditadura Militar

Os planos políticos de Herbert Levy e seus companheiros tiveram duração efêmera e não vingaram. Levy sonhava em ser candidato a governador, depois de um sonhado golpe, que derrubaria Goulart. O golpe veio de fato, consumado pelos militares, que acabaram com as eleições e sufocaram as lideranças políticas da época. Notícias Populares perdeu sua finalidade política. Ironicamente, as duas publicações ideologicamente antagonistas – Última Hora e Notícias Populares – iriam parar nas mãos de um único grupo, o Frias-Caldeira, da empresa Folha da Manhã.

De 1971 a marco de 1990, o editor do NP foi Ibrahim Ramadam. É nesse período que o NP registrou seus maiores hits, como a fantástica história do “bebê diabo”. Por 22 edições, de 11 de maio de 1975 a 1 de junho daquele mesmo ano, o NP deu em manchete uma história completamente inventada sobre um suposto nascimento de uma criança, com a aparência de demônio, em São Bernardo do Campo, no Grande ABC. A história foi retroalimentada pela população, que via o bebê diabo em telhados, na rua e até tomando táxis. As edições esgotavam nas bancas.

Depois do bebê diabo foi a vez da loira fantasma que espreitava motoristas e estudantes nos banheiros das escolas. A loira era uma morta-viva, que se aproximava de alguém para pedir que o infeliz lhe tirasse o algodão das narinas.

Mais tarde viria outro grande hit, o Pelezão, esse sim, um personagem verdadeiro. Pelezão era um indigente. Ele estava na fila de um albergue público quando foi chamado por uma psicóloga com problemas conjugais. Pelezão entrou no carro da psicóloga e manteve uma breve relação sexual com ela. Os dois foram apanhados pela polícia. Pelezão virou herói do NP. Ganhou apelido porque a psicóloga supostamente o chamava de “meu Pelezão” nos momentos mais ardentes do breve encontro. Pelezão estrelou um filme pornô, arrumou emprego como leão-de-chácara de um restaurante do Bixiga até desaparecer novamente no anonimato.

Psicanálise e sensacionalismo

A imprensa sensacionalista ancora-se em aspectos psicológicos. A exemplo de muitos filmes de Hollywood, no jornal a sensação tem uma função terapêutica e é o veículo do leitor para trafegar pelas zonas proibidas do inconsciente. Notícias Populares soube fazer isso muito bem e conquistar seu público.

Um jornal sensacionalista, como o NP, ancora-se em uma espécie de balança inconsciente: às vezes ele é transgressor (id); às vezes, o seu contrário, tem valor punitivo (superego). Assim, em certas reportagens o NP vangloriava-se de divulgar um suposto campeonato de sexo, entre atores pornôs; e, em outra matéria, mostrava um ladrão morrendo sendo “comido aos pouquinhos pela Aids”.

O NP seguiu essa fórmula de sucesso. Depois de uma reforma gráfica, consumada em 1990, o NP foi tirado das mães de Ramadam. Aquela redação folclórica que havia na época foi substituída. O jornal se tornou mais tecnicista e menos romântico. A mão sobre o sensacionalista tornou-se pesada. O jornal caiu em desgraça. O Ministério Público queria que ele fosse vendido dentro de um saco plástico. O NP foi obrigado a recuar. Os “presuntos” saíram da capa. Vieram as manchetes econômicas e políticas. O leitor debandou. Foi embora para sempre. Sem anunciantes, com baixa venda em banca, o NP foi morrendo lentamente até apagar sem aviso prévio no início da noite de uma sexta-feira de verão, para surpresa de seus próprios redatores e repórteres. Sua última manchete, à Jean Mellé, poderia ser: “Acabou o trampo e levou um pé na bunda”.

Pós-doutoramento (2013)

"A cultura rústica urbaniza-se: um estudo sobre os caboclos de Piedade do Paraopeba em intersecção com os caipiras do Rio Bonito" (orientação: Prof. Dr. Luiz Roberto Alves) - Cátedras Unesco de Comunicação e Gestão de Cidades da Universidade Metodista de São Paulo.

 

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