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Escassez de água exige ação de todos

27/03/2015 15h55 - última modificação 07/08/2015 16h42

Fotos Lara Molinari

O recado foi dado logo de cara: “Não adianta somente orar se não houver mudança de comportamento”. A fala da professora Rosane de Oliveira, agente da Pastoral Universitária, deu a tônica do lançamento do movimento Fonte de Mudanças na noite de quinta-feira, 26 de março, iniciativa da Universidade Metodista de São Paulo para o enfrentamento da crise histórica de abastecimento de água no Estado.

Confira a matéria produzida pela Agicom, agência experimental da Faculdade de Comunicação da Metodista e o evento na íntegra nos vídeos ao final do texto:

De um modo ou de outro, a ideia esteve presente nas falas de todos os integrantes da mesa-redonda “A água e suas múltiplas perspectivas: Fonte de Mudanças” e mesmo antes, na intervenção da Pró-Reitora de Graduação, professora Vera Stivaletti, e na apresentação do Núcleo de Arte e Cultura (NAC). Professora Vera exortou a todos que saíssem do encontro com a atitude de multiplicar o movimento. Já as coordenadoras do NAC, Cláudia Cezar, e do Centro de Sustentabilidade, professora Waverli Neuberger, além da professora Rose Maria de Souza, de Educação Física e do Núcleo de Formação Cidadã, mobilizaram a plateia em movimentos coordenados, emulando o barulho da chuva e finalizando com o convite: “Movimentos precisam ser bem articulados”.

Os convidados Cesar Pegoraro, da Fundação SOS Mata Atlântica, João Ricardo Caetano, secretário de Gestão Ambiental de São Bernardo, e Renato Tagnin, urbanista e professor do Senac, afluíram para um mesmo ponto: não existe crise hídrica. Para Cesar, a crise é da humanidade, que não deu respostas rápidas ao problema. João Caetano é categórico: vivemos uma crise de gestão. E Renato, munido de diversos gráficos com estudos de anos atrás que já apontavam para a escassez histórica de água, repetia: “Não é praga do Faraó nem culpa de São Pedro”.

Apesar da gravidade da situação, Cesar Pegoraro acredita que toda crise traz uma oportunidade. “Espero que as soluções sejam efetivas, não temporárias.” O educador ambiental enfileirou uma série de causas para o atual cenário: a subversão do ciclo dos recursos naturais, o desmatamento da Mata Atlântica, a invasão de áreas de mananciais que acarreta a perda da vegetação, o despejo de esgoto nos rios, tudo acrescido do descaso com o saneamento básico.

“Saneamento básico nunca foi tema relevante. Temos algumas situações paradoxais. Vivemos da água que agredimos. 80% das doenças vêm da água, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde). Temos que começar a entender que saneamento básico é básico e barato. É saúde preventiva”, defendeu.

O militante da SOS Mata Atlântica também apontou situações absurdas como a do Rodoanel ter sido erguido e cimentado áreas de mananciais ou a lei que classifica rios em classes, permitindo que os de “classe 4” possam ser poluídos. Também lamentou a perda de 40% da água devido a vazamentos e estruturas antigas da rede, “uma Guarapiranga inteira tratada para não chegar às torneiras. Preservar no Brasil nunca foi economicamente viável. Temos que inverter essa lógica”, destacou.

Crise anunciada há 10 anos      

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João Ricardo Guimarães Caetano, secretário de Gestão Ambiental de São Bernardo

Se Cesar Pegoraro apontou muitas das causas da crise, o secretário de Gestão Ambiental de São Bernardo, João Ricardo Guimarães Caetano (foto acima), criticou o modo como a situação vem sendo enfrentada. Ele citou que o Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos já havia diagnosticado o cenário que vivemos hoje. “A solução foi apontada há mais de 10 anos pelo próprio governo paulista, mas a solução apontada não foi adotada. Confiou-se que a chuva seria suficiente. Ficamos reféns da chuva”, entende.

João Ricardo enxerga um quadro de improvisos no governo, listando exemplos como o anúncio do rodízio por um diretor da Sabesp seguido de desmentido do governador do Estado, ou o anunciado plano de uso de água da represa Billings (que recebe água do poluído Rio Pinheiros), descartado posteriormente por conta do alto custo.

Para o secretário, o pior ainda está por vir: será no período de estiagem, a partir de maio de 2016. Mesmo assim, ainda não foi definido um plano de emergência para enfrentar esse período e a eventual falta de água em locais como escolas e hospitais. Mas ele também espera que a crise possa ter um aspecto benéfico: “Talvez essa crise crie uma oportunidade para que a sociedade vire de frente para os rios”.

Ocupação destrutiva, uma opção política    

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Renato Tagnin, professor do Senac

A mudança dramática no uso do solo, seja pela destruição sistemática ou pela ocupação desordenada, é opção exclusiva do homem. “Não é praga dos Faráos”, brinca o arquiteto e urbanista Renato Tagnin (foto), chamando a atenção para políticas públicas como a do agronegócio ou para as que empurram moradores cada vez mais para periferias urbanas, com sérias consequências sobre áreas de nascentes.

Renato Tagnin é especializado em Planejamento Urbano Metropolitano pela Universidade de Roma e coordenou, entre outros, o Grupo de Controle de Inundações e o Conselho Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Prefeitura de São Paulo. Seus estudos apontam para um cenário desolador se nada for feito por gestores públicos, que a seu ver deixam nas mãos “do mercado” a exploração do solo: em 2030 pelo menos 55% da Amazônia estarão queimados e degradados e daqui a 10 anos, em 2025, todas as grandes cidades estarão tratando esgoto para beber, ou seja, não haverá fontes naturais suficientes de água, segundo a ANA (Agência Nacional de Águas).

“Sistemas viários como o Rodoanel são construídos sobre rios e nascentes, enquanto afluentes que passam pelas áreas centrais são enterrados em favor da especulação imobiliária. Populações mais pobres são expulsas para áreas periféricas onde estão os mananciais, gerando redução da biodiversidade e da evapotranspiração e na própria reciclagem natural do solo”, descreveu o urbanista.

O mesmo cenário preocupante ocorre nas chamadas novas fronteiras agrícolas, que brotam à custa de mais desmatamentos. A cultura da cana em São Paulo, por exemplo, puxou a plantação de soja para o Centro-Oeste do País, que por sua vez empurrou a criação de gado para a Amazônia. Renato Tagnin lembrou ainda que, além do comprometimento da natureza, a ocupação desordenada do solo tem um custo social enorme: assassinatos rurais, conflitos no campo e trabalho escravo são algumas das consequências.

“O avanço do agronegócio transformou o Brasil no maior consumidor de agrotóxicos do mundo, 43% dos quais vão para plantações de soja, 13% para o milho e 10% para a cana”, citou sobre o malefício que isso causa à saúde humana e que será potencializado com a quantidade de produtos químicos jogados para tratamento de esgoto destinado à transformação da água potável para consumo doméstico e para reuso.

O urbanista fez coro com os demais palestrantes de que a crise não é de água, mas de gestão dos recursos hídricos, já que há anos agências de pesquisa e estudiosos alertam para a falta de chuvas e aumento do consumo com o adensamento urbano. “Agora os governos se debruçam sobre projetos megalômanos, de buscar água em bacias longínquas como Barra Bonita, Jurumim, Juquiá e Represa do Jaguari. O problema é que não tem manancial sobrando: estamos nos estapeando para ter água uns dos outros”, resumiu.

População rebelada  

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Cesar Pegoraro, da SOS Mata Atlântica

"Há saídas para esse futuro sombrio?", indagou professora Márcia Velasques, do Núcleo de Formação Cidadã da Metodista.

Com mobilização e ação, foi a resposta unânime dos três conferencistas, que exortaram a população a ser protagonista nas respostas ao problema da escassez hídrica. Cesar Pegoraro, da SOS Mata Atlântica (foto), disse que a população deve se sentir incomodada e lutar pela sobrevivência. Elogiou o movimento Fonte de Mudanças da Universidade Metodista e conclamou ao surgimento de outras ações semelhantes de reflexão e atitudes.

“Temos que nos sentir partes da solução. O cenário existe e depende de nós enfrentá-lo”, convidou, sugerindo a criação de movimentos coletivos como o “Existe rio em São Paulo”, que está mapeando as nascentes da Capital, ou o “Cisternas já”, que orienta para a captação de água das chuvas.

O secretário de Gestão Ambiental de São Bernardo, João Ricardo Caetano, se diz otimista nas soluções porque agora o problema é conhecido e as formas de combatê-lo estão à mão. A partir dessa conscientização, também propôs à população cobrar os poderes públicos. “Vamos nos indignar com o rio poluído que atravessa nosso bairro ou vamos viver acomodados com esse esgoto correndo ao nosso lado?”, questionou provocativo, seguindo o urbanista Renato Tagnin, que chamou a população a se rebelar, “mexer o corpo” e usar o conhecimento crítico que se dissemina em torno do meio ambiente para agir em seu benefício. “Água é como a corrente sanguínea do nosso corpo. Sem ela, acaba a vida”, sublinhou

Professora Waverli Neuberger, coordenadora do Centro de Sustentabilidade da Metodista, também acredita que as informações são fartas e o conhecimento está acessível a todos, mas que a população está passiva. “Não fomos educados para preservar os recursos naturais e não estamos sabendo unir todas as informações fragmentadas a respeito deles”, lamentou.

O Movimento Fonte de Mudanças foi lançado pela Universidade Metodista de São Paulo com a crença de que, na luta contra a escassez hídrica, não bastam apenas campanhas de economia de água: é preciso que as pessoas se mobilizem, tomem consciência e mudem suas atitudes para além do período de crise.

Abertura: 

 

Palestra Cesar Pegoraro: 

 

Palestra João Ricardo Guimarães Caetano:


Palestra Renato Tagnin:


Questões da plateia:

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