Uma inspiração pedagógica - Paulo Freire
O
uso de tecnologias de informação e comunicação em processos educativos
a distância ou semipresenciais gerou uma grande discussão sobre os
papéis de educadores e educandos. Fala-se muito em exigir uma atitude
mais ativa dos alunos, seja na leitura dos textos, nos questionamentos
feitos ao docente e na interação com os demais colegas de turma.
Discute-se também a necessidade de os professores abandonarem certas
posturas que supostamente os reconhecem como única fonte do saber.
Tais exigências, contudo, são novidades apenas aparentemente, pelo
menos para aqueles que não conhecem a pedagogia de Paulo Freire. Veja,
por exemplo, o que dizia esse grande educador brasileiro já em 1965:
“Assim, em lugar de escola, que nos parece um conceito, entre nós,
demasiado carregado de passividade, em face de nossa própria formação
(mesmo quando se lhe dá o atributo de ativa), contradizendo a dinâmica
fase de transição, lançamos o Círculo de Cultura. Em lugar de
“professor”, com tradições fortemente doadoras, o Coordenador de
Debates. Em lugar de aula discursiva, o diálogo. Em lugar de aluno, com
tradições passivas, participante de grupo. Em lugar dos “pontos” e
programas alienados, programação compacta, “reduzida” e “codificada” em
unidades de aprendizado” (FREIRE, P. Educação com prática da liberdade, 16a ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. p. 103).
Por outro lado, assumir um papel de coordenador de debates não
significa esperar passivamente que o educando descubra e questione o
mundo a partir da distribuição de materiais. Em um bate-papo com alunos
de 7a e 8a séries da Escola Vera Cruz, em São Paulo, em 1988, Paulo
Freire foi enfático:
“Uma educadora nunca pode se omitir. Uma educadora nunca pode
esconder-se diante dos alunos. Ela nunca pode ter vergonha de ser uma
educadora. Quer dizer, ela tem que assumir-se como educadora, como quem
educa” (FREIRE, P. Pedagogia dos sonhos possíveis.
Freire, A. M. A. (Org.). São Paulo: Editora Unesp, 2001. p. 109.).
Dessa forma, “o papel do professor, da professora, é mais do que
simplesmente abrir caminho. É o de quem também mostra o caminho”
(Ibidem).
Paulo Freire não teve tempo para pensar a
educação a distância e semipresencial como as conhecemos hoje. No
entanto, ele pode continuar nos servindo de inspiração. Ser um educador
em um ambiente mediado por tecnologias de informação e educação,
portanto, é muito mais do que distribuir materiais e esperar
questionamentos passivamente. Tal postura é particularmente tentadora
quando não estamos diante dos alunos fisicamente e pela facilidade de
se esconder atrás de um software qualquer. Educar a distância ou
semipresencialmente exige uma disposição ética para provocar e
participar do diálogo com os alunos.